domingo, 6 de maio de 2018

Aula 07 - ÉTICA CRISTÃ E DOAÇÃO DE ÓRGÃOS


2º Trimestre/2018

Texto Base: 1Coríntios 15:35-45

 
“Conhecemos o amor nisto: que ele deu a sua vida por nós, e nós devemos dar a vida pelos irmãos” (1João 3:16).

 

INTRODUÇÃO

Nesta Aula trataremos a respeito da Ética Cristã e Doação de Órgãos. O ato de doar órgãos para transplante é uma expressão concreta de amor cristão (1João 3:16); é a boa obra que expressa o amor que sentimos pelo outro. O nosso amor a Deus está proporcionalmente ligado ao nosso amor ao próximo. Quem ama, doa. O problema na doação de órgão é a falta de confiança em algumas instituições que gerenciam banco de órgãos. A imprensa já chegou a noticiar casos em que sangue e outros órgãos foram objeto de venda, causando desconfiança entre muitas pessoas. Também, existem muitas famílias que rejeitam a doação por dilemas éticos e por falta de informação. Apesar disso, o cristão não deve esmaecer neste bom intento. A doação de órgãos é uma atitude meritória e que deve ser tomada por quem vive a fazer o bem neste mundo, como são os servos de Jesus Cristo, já que sabemos que o nosso corpo, após a morte, para nada mais servirá senão para tornar ao pó, uma vez que o corpo que receberemos quando do arrebatamento da Igreja será um corpo glorificado. Por que, então, mesmo após a nossa morte, não fazermos o bem a quem precisa de nossos órgãos para continuar sobrevivendo?

I. DOAÇÃO DE ÓRGÃOS: CONCEITO GERAL

Doção de Órgãos é a concordância expressa, ou presumida, por parte de uma pessoa, consentindo que seus órgãos sejam retirados após sua morte para serem aproveitados por pessoas portadoras de doenças crônicas, visando aumentar-lhes sua sobrevida. Doar órgãos do corpo humano é uma dádiva, é a permissão de colheita de tecidos ou órgãos do seu próprio corpo, para fins de diagnóstico ou para fins terapêuticos e de transplantação. Em suma, podemos definir Doação de Órgãos como a liberação por parte do indivíduo, que após sua morte “constatada pela medicina”, seus órgãos sejam retirados e postos em pessoas que precisem, dando mais vida temporal. É válido ressaltar que a transfusão de sangue, a dádiva de óvulos e de esperma, e a transferência e manipulação de embriões, são objeto de legislação especial, bem como a colheita de órgãos para fins de investigação científica.

Doação de órgãos de recém-nascido anencéfalo. A retirada de órgãos do ser humano nesta situação não está ultrapassando os limites tolerados pela ética e pela lei? Não podemos esquecer que a norma alusiva à utilização de órgãos e tecidos humanos para transplantes faz referência à morte encefálica, traduzida pelos critérios adotados pelo Conselho Federal de Medicina. Alguns médicos, porém, dizem que a retirada de órgãos de um recém-nascido anencéfalo é uma questão que já está contemplada na nossa legislação.

Ato que não deve comprometer a vida do doador. Existem transplantes que são considerados comuns, estes geralmente expressam a viabilidade da vida e o amor que se tem pelo ente querido ou até mesmo por um estranho, denotando amor ao próximo; são aqueles transplantes que são marcados pela retirada de uma parte do corpo para que outro o receba de forma que lhe assegure a vida; o importante aqui é que o doador continua vivo, e do ponto de vista até dos que são contrários a doação de órgãos, neste aspecto, é perfeitamente aceitável. Portanto, quando se fala de doação de órgãos do corpo, está-se falando em um ato que não compromete a vida do doador, ou seja, ou ele já está morto ou, então, trata-se de órgão duplo ou regenerável. Jamais se pode conceber uma doação de órgãos que venha a causar a morte de alguém, pois, como vimos na lição sobre a eutanásia e o suicídio, só Deus é o dono da vida (1Sm.2:6), não podendo o homem dela dispor, ainda que sob o argumento de permitir a sobrevida ao próximo.

Doar órgãos é fazer o bem sem olhar a quem. Quem faz o bem, colhe o bem; é a lei universal da semeadura. Não resta dúvida de que doar órgãos do corpo humano é fazer bem ao seu próximo. Se alguém precisa de um órgão para sobreviver e nós podemos fornecê-lo, enquanto servos de Deus nós devemos fazê-lo, pois a Bíblia é bem clara ao afirmar que devemos fazer o bem que está a nosso alcance e, se não o fizermos, estaremos pecando (Tg.4:17; 1João 3:17,18).

Assim, o ato de Doação de Órgãos se apresenta como uma manifestação do amor de Deus na vida do cristão, um amor altruísta, ou seja, um amor que não pensa em si mesmo, mas que leva em consideração o outro, o próximo, a quem devemos amar como a nós mesmos (Lv.19:18; Mt.22:39). Portanto, todo cristão deve doar seus órgãos “post mortem” ou, se lhe for solicitado, contribuir para a saúde de outrem doando um órgão duplo ou regenerável (como o sangue ou o leite, por exemplo).

II. QUESTIONAMENTOS PERTINENTES

1. Há na Bíblia alguma proibição de doação de órgãos? Não, não há. É verdade que sempre há aqueles que gostam de encontrar nas entrelinhas da Bíblia profecias e previsões sobre situações futuras; são os desnutridos intelectualmente, ou que possuem um subdesenvolvimento intelectual, que acham de forma explicita que até a doação de sangue é pecado, pois segundo eles o sangue é a vida, logo não se pode doar; mas, se o sangue é a vida, Jesus deu a própria vida por nós; portanto, não há motivos para que não sigamos o Seu exemplo, uma vez que ele mesmo mandou-nos ser seus imitadores. Portanto, não há na Bíblia nada, pelo menos especificamente, nem a favor nem contra a doação de órgãos humanos.

2. Deve ser obrigatória a doação de órgãos?  Não. O próprio Deus não invade o livre-arbítrio do homem, não podendo, pois, qualquer governo querer fazê-lo. É preciso que o Governo conscientize seus cidadãos da importância da doação de órgãos, do significado deste gesto, mas não prive o indivíduo do direito de dar o destino que quiser a seu corpo. A igreja, também, não deve forçar pessoa alguma a fazer doação de órgãos, mas deve ensinar que este gesto é uma revelação do verdadeiro amor cristão e que, quem o fizer de coração, certamente será abençoado e é um poderoso instrumento de Deus para a vida de outra pessoa. Não é por força nem por violência, mas pelo Espírito de Deus (Zc.4:6). O ato de doação de órgãos, para ter validade perante Deus, há de ser voluntário, pois Deus ama a quem o faz com alegria, de coração, e não por necessidade ou imposição (2Co.9:7; Mc.12:43,44; Lc.7:44-50).

3. Há algum benefício espiritual aos doadores de órgãos? Não, não há nenhum benefício espiritual, nem nesta vida nem no porvir. Existem alguns conceitos errôneos de que, na doação de órgãos, a pessoa alcançará sobrevida no corpo de um terceiro, algo disseminado pela milenar e antibíblica crença na transmigração das almas; ou que este gesto representa um ato de caridade ou uma boa obra que representará evolução espiritual (entendimento dos espíritas kardecistas); ou purgação de pecados (entendimento de católicos romanos). Quem doa órgãos com esta motivação está sendo interesseiro, egoísta, podendo ser comparado a Judas Iscariotes no episódio da mulher que ungiu o corpo de Jesus (João 12:3-6), uma filantropia que visa o próprio interesse. Estes já têm aqui o seu galardão e, como o fariseu da parábola de Jesus (Lc.18:9-14), nenhuma justificação obterão, até porque as obras não salvam pessoa alguma (Gl.2:16).

4. Doação de órgãos é uma demonstração de falta de fé em Deus na cura de enfermidades? Claro que não. Deus opera, também, pela ciência e se há possibilidade de nós cedermos um órgão para a cura da enfermidade de alguém, estaremos mostrando o amor de Deus que está em nossos corações e contribuindo para a sobrevida. O desenvolvimento da ciência é resultado do amor de Deus para com o homem e podermos servir de instrumento para a cura de alguém, ainda que pelas mãos dos médicos, é uma grande bênção. Jamais a Bíblia Sagrada condenou a prática da medicina ou a utilização de seus recursos. Tanto assim é que até o apóstolo Paulo, cujos lenços e aventais tinham até virtude (At.19:11,12), não deixou de receitar um remédio a seu filho na fé, Timóteo (1Tm.5:23). Uma atitude desta natureza, ademais, é querer impor a Deus o modo pelo qual Ele deve operar, o que é inadmissível, pois Deus é o Senhor e nós somos apenas Seus servos.

5. Doar sangue é pecado segundo a Bíblia? A doação de sangue é um ato de amor ao próximo, portanto, um ato que se harmoniza com a ética bíblica. A Bíblia nos manda amar ao próximo com amor sacrificial (cf. João 15:13). Ora, se oferecer a vida em favor dos que precisam é incentivado, uma simples doação de sangue, que é capaz de aliviar a dor dos que sofrem enfermidades graves, é um gesto ínfimo, porém sobremodo significante. Aliás, o primeiro grande doador de sangue foi Jesus Cristo, que derramou todo seu sangue na cruz para nos salvar (Lc.22:20).

Argumentos contrários à doação de órgãos sempre estão relacionados a noções errôneas sobre o ser humano ou sobre a Palavra de Deus. Os argumentos contrários à transfusão de sangue, desenvolvidos notadamente por algumas seitas, são fruto de uma errônea concepção do sangue como sendo a “alma” das pessoas, o que, na verdade, não corresponde ao ensinamento bíblico a respeito. Sendo assim, dizer que a transfusão de sangue é pecado e que doar sangue é pecado é forçar os textos bíblicos a dizer o que não dizem, é colocar na boca dos autores bíblicos conceitos que eles não ensinaram, pois doação e transfusão de sangue são coisas relativamente modernas e não existiam nas épocas bíblicas. E também tentar ligar a ingestão de sangue na forma de alimentos com a transfusão, não tem qualquer sentido dentro do contexto bíblico devido as singularidades de cada uma delas.

6. Doar órgãos compromete a ressurreição do crente? Em absoluto. Há quem não permite a doação de órgãos porque entende que a ressurreição ficaria comprometida. Afinal, “como entrarão na Jerusalém Celeste sem o coração, ou sem os pulmões, ou desprovidos de rins?”. As pessoas que pensam assim, frutos de conceitos errados e sem respaldo bíblico, esquecem de que a ressurreição, no momento do arrebatamento, se fará em corpo glorioso, pois a carne e o sangue não herdarão o reino de Deus (1Co.15:44,50,52-54).

“Semeia-se corpo animal, ressuscitará corpo espiritual. Se há corpo animal, há também corpo espiritual. E, agora, digo isto, irmãos: que carne e sangue não podem herdar o Reino de Deus, nem a corrupção herda a incorrupção. Num momento, num abrir e fechar de olhos, ante a última trombeta; porque a trombeta soará, e os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós seremos transformados. Porque convém que isto que é corruptível se revista da incorruptibilidade e que isto que é mortal se revista da imortalidade. E, quando isto que é corruptível se revestir da incorruptibilidade, e isto que é mortal se revestir da imortalidade, então, cumprir-se-á a palavra que está escrita: Tragada foi a morte na vitória”.

Há pessoas mutiladas, sem pernas e sem braços, sem olhos, mas que, ao ressuscitarem, terão corpo espiritual perfeito.

Mas a nossa cidade está nos céus, donde também esperamos o Salvador, o senhor Jesus Cristo, que transformará o nosso corpo abatido para ser conforme o seu corpo glorioso, segundo o seu eficaz poder de sujeitar também a si todas as coisas” (Fp.3:20, 21).

Na eternidade, todos seremos perfeitos, como perfeitos são os santos anjos. O corpo será “corpo glorioso” e “corpo espiritual” (1Co.15:42,43), que não precisará de órgãos físicos.

“Assim também a ressurreição dos mortos. Semeia-se o corpo em corrupção, ressuscitará em incorrupção. Semeia-se em ignomínia, ressuscitará em glória. Semeia-se em fraqueza, ressuscitará com vigor”.

Também, a ressurreição para o juízo do trono branco será uma restauração milagrosa, não ficando Deus adstrito a peculiaridades como a decomposição dos organismos (Ap.20:12,13). Para Deus, no dia da ressurreição, não haverá nenhum problema, estejam onde estiverem as partes de um determinado corpo.

“E vi os mortos, grandes e pequenos, que estavam diante do trono, e abriram-se os livros. E abriu-se outro livro, que é o da vida, e os mortos foram julgados pelas coisas que estavam escritas nos livros, segundo as suas obras. E deu o mar os mortos que nele havia; e a morte e o inferno deram os mortos que neles havia; e foram julgados cada um segundo as suas obras”.

7. Existe o risco da comercialização? Sim. Mas não é por causa disto que deixaremos de fazer o bem. Um grande entrave para a doação de órgãos é o receio de que os mesmos sejam objeto de comercialização, o famoso “tráfico de órgãos”, negócio escuso que tem crescido enormemente no mundo e que está, inclusive, relacionado com o aborto, com a adoção ilegal e com o tráfico de crianças em todo o mundo. Se alguém utilizar indevidamente os órgãos doados, ele prestará contas diante de Deus (quiçá diante dos homens) pela sua conduta; todavia, teremos feitos a nossa parte. A responsabilidade pelos atos é individual. Nunca devemos deixar de aproveitar uma oportunidade para fazer o bem, pois foi assim que Jesus procedeu em Seu ministério terreno – “...o qual andou fazendo o bem e curando a todos os oprimidos do diabo, porque Deus era com ele” (At.10:38). 

III. DOAR ÓRGÃOS É UM ATO DE AMOR

Doar órgãos e tecidos humanos é um ato de amor, de empatia e de solidariedade. O verdadeiro cristão precisa atentar para a sua consciência, que deve estar sempre alinhada aos parâmetros bíblicos para que possa atuar segundo a reta justiça.

1. O princípio da empatia e da solidariedade. A Doação de Órgãos é um gesto altruísta e revelador do verdadeiro amor que Cristo coloca em nossos corações; é um gesto de empatia e de solidariedade com o próximo; é uma expressão do verdadeiro amor cristão e uma atitude em defesa da vida, que deve ser, sempre, incentivada e estimulada por atitudes práticas pela igreja. A doação deve ser altruísta e voluntária, ou seja, deve ser feita sem qualquer interesse que não seja o bem-estar do próximo, bem como deve partir do interior do coração; deve ser algo voluntário e decidido, sem o que não terá valor algum do ponto-de-vista espiritual.

O corpo pertence a Deus (1Co.6:20), mas ele nos foi dado para ser por nós administrado com responsabilidade, e doar um órgão para ajudar alguém a continuar vivendo, quando nós não temos mais condições de vida, pode significar apenas um empréstimo, pois na ressurreição, se for o caso, o órgão voltará para o seu devido lugar, pela infinita sabedoria de Deus.

É de bom alvitre que a doação de órgãos seja acompanhada pela família do cristão, a fim de impedir que este gesto altruísta seja desvirtuado por interesses comerciais ou escusos, lembrando que a lei brasileira reconhece este direito aos familiares. Entendemos, inclusive, que, se houver fortes indícios de que os órgãos serão retirados por pessoas escusas e sem qualquer credibilidade, que a família do doador exerça o direito de recusa de retirada dos órgãos do ente querido falecido. A Bíblia diz que tudo deve ser feito por fé e sem problema de consciência, não devendo consentir com os que praticam o pecado.

2. O princípio do verdadeiro amor. Salvar a vida de alguém é uma demonstração de elevado sentido espiritual e moral. Cristo ensinou que não existe maior amor do que doar a sua vida em benefício do próximo (João 15:13). Nosso Senhor Jesus Cristo não apenas doou algum órgão por nós, mas deu toda sua vida em nosso lugar, na cruz do Calvário. Ele se doou, de corpo e alma, para que não morrêssemos. O apóstolo João nos exorta: “Conhecemos a caridade nisto: que ele deu a sua vida por nós, e nós devemos dar a vida pelos irmãos. Quem, pois, tiver bens do mundo e, vendo seu irmão necessitado, lhe cerrar o seu coração, como estará nele a caridade de Deus? ” (1João 3:16,17). Nesse texto, vemos o apóstolo do amor ensinar que devemos “dar a vida pelos irmãos”, e que os proprietários de “bens” no mundo que fecham o coração para o irmão necessitado não têm o amor de Deus. Podemos entender que um órgão a ser doado é um “bem” do mais alto valor para a salvação da vida orgânica de um doente. Então, “não nos cansemos de fazer o bem, porque a seu tempo colheremos, se não houvermos desfalecido” (Gl.6:9).

CONCLUSÃO

Diante do que foi exposto esperamos que o elevado gesto de doar órgãos tenha o seu real alcance nos corações das pessoas, principalmente dos cristãos, a ponto de não recuar em momentos oportunos, cônscios de que esta ação, conforme vimos, em nada contraria os preceitos éticos ou bíblicos. Lembre-se que a doação de órgãos é um ato de consciência e amor ao próximo, e que este ato pode salvar vidas. É bom ressaltar, porém, que o ideal é manifestar a vontade de doar e informá-la à família. Não adianta deixar o desejo expresso por escrito nem um registro, mesmo gravado em vídeo ou declarado em uma rede social, por exemplo. A decisão final é dos familiares; são eles que definirão quais órgãos e tecidos serão doados. Por isso, é fundamental que os doadores deixem seu desejo claro para os parentes.

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Luciano de Paula Lourenço
Disponível no Blog: http://luloure.blogspot.com
Referências Bibliográficas:
Bíblia de Estudo Pentecostal.
Bíblia de estudo – Aplicação Pessoal.
Comentário Bíblico popular (Novo Testamento) - William Macdonald.
Revista Ensinador Cristão – nº 74. CPAD.
Comentário Bíblico Pentecostal. CPAD.
Comentário do Novo Testamento – Aplicação Pessoal. CPAD.
Hans Ulrich Reifler. A ética dos Dez Mandamentos. Vida Nova.
Dr. Caramuru Afonso Francisco. O cristão e a doação de órgãos do corpo. PORTALEBD_2002.
Pr. Elinaldo Renovato. O cristão e a doação de órgãos. EBD_2002.

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