domingo, 16 de janeiro de 2022

Aula 04 – A ESTRUTURA DA BÍBLIA

 

1º Trimestre/2022


Texto Base: Lucas 24:44-49


“E disse-lhes: São estas as palavras que vos disse estando ainda convosco: convinha que se cumprisse tudo o que de mim estava escrito na Lei de Moisés, e nos Profetas, e nos Salmos” (Lc.24:44).

Lucas 24:

44.E disse-lhes: São estas as palavras que vos disse estando ainda convosco: convinha que se cumprisse tudo o que de mim estava escrito na Lei de Moisés, e nos Profetas, e nos Salmos.

45.Então, abriu-lhes o entendimento para compreenderem as Escrituras.

46.E disse-lhes: Assim está escrito, e assim convinha que o Cristo padecesse e, ao terceiro dia, ressuscitasse dos mortos;

47.e, em seu nome, se pregasse o arrependimento e a remissão dos pecados, em todas as nações, começando por Jerusalém.

48.E dessas coisas sois vós testemunhas.

49.E eis que sobre vós envio a promessa de meu Pai; ficai, porém, na cidade de Jerusalém, até que do alto sejais revestidos de poder.

INTRODUÇÃO

Nesta Aula trataremos da “Estrutura da Bíblia”. O objetivo é: mostrar que a Bíblia está organizada e que ela se divide em dois testamentos; esclarecer como os livros do Antigo Testamento são classificados; expor a classificação dos livros do Novo Testamento. Conhecer a estrutura da Bíblia é importante para manejá-la bem. Paulo exortou a Timoteo: “Procura apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade” (2Tm.2:15). A Bíblia Sagrada é “a Palavra da Verdade”. No Sl.68:11a é dito textualmente que “o Senhor deu a palavra”. Em Hb.1:1, o escritor afirma que o Senhor falou antigamente aos pais pelos profetas de muitas maneiras e uma destas maneiras foram as Escrituras Sagradas, que compunham “a lei e os profetas” (Mt.7:12; 22:40), lembrando que “a lei” foi escrita por Moisés (Dt.31:24), sendo ele próprio, Moisés, um profeta (Dt.34:10). Mas o escritor aos hebreus não diz que eram divinas apenas as Escrituras do Antigo Testamento, mas, também, afirma que passou Deus a falar pelo Filho, que é o Verbo de Deus (Jo.1:1). Ora, o Filho já era revelado por intermédio das Escrituras do Antigo Testamento (Jo.5:39) e continuou a sê-lo através do Novo Testamento, que é o registro determinado pelo Espírito Santo para tudo quanto Jesus ensinou (João14:26; 2Pd.3:16,17), registro este que é a verdade e nossa fonte de santificação (Jo.17:17), pois, desde a Antiga Aliança, o Senhor utilizava do escrito para memória do que havia dito (Ex.17:14a).

I. COMO A BÍBLIA ESTÁ ORGANIZADA

1. Definição do termo Bíblia

O nome "Bíblia" vem do grego "Biblos", nome da casca de um papiro do século XI a.C. Ao rolo pequeno de papiro, os gregos chamavam "biblion", e ao plural deste chamavam "biblos". Portanto, o vocábulo Bíblia deriva da língua grega.

Os primeiros a usar a palavra "Bíblia" para designar as Escrituras Sagradas foram os discípulos do Cristo, no século II d.C. Atribui-se a João Crisóstomo (398 – 404) a disseminação desse vocábulo. O vocábulo "Bíblia" significa etimologicamente "coleção de livros pequenos", isto porque os livros da Bíblia são pequenos, formando todos um volume não muito grande como tão bem conhecemos. De fato, a Bíblia é uma coleção de livros, porém, perfeitamente harmônicos entre si. É devido a isso que a palavra Bíblia sendo plural no grego passou a ser singular nas línguas modernas.

Materiais Originais utilizados pelos escritores dos Autógrafos: Papiro e o Pergaminho

Ø  Papiro: Material extraído de uma planta aquática desse mesmo nome. Há várias menções dele na Bíblia, como por exemplo, Jó 8:11. De papiro deriva o termo papel. Seu uso na escrita vem de 3.000 a.C., no Egito.

Ø  Pergaminho: É a pele de animais, curtida e preparada para escrita. É material superior ao papiro, porém de uso mais recente do que aquele. Teve seu uso generalizado a partir do início do século I, na Ásia Menor. É também citado na Bíblia; exemplo: 2Timóteo 4:13.

Línguas Originais utilizados pelos escritores dos Autógrafos

Ø  Hebraico: Para o Antigo Testamento.

Ø  Grego: Para o Novo Testamento.

Ø  Aramaico: O Antigo Testamento foi escrito em Hebraico, uma língua da família das línguas semíticas, caracterizada pela predominância de consoantes; exceto Esdras 4:8 a 6:18; 7:12-16; Jeremias 10:11; Daniel 2:4 a 7:8, que foram lavrados em Aramaico.

Particularidades da Bíblia

Ø  Canonizados: 66 Livros, sendo 39 no Antigo Testamento e 27 no Novo Testamento.

Ø  Divisão em capítulos: São 1.189, sendo 929 no Antigo Testamento e 260 no Novo Testamento.

Ø  Divisão em versículos: São 31.173, sendo 23.214 no Antigo Testamento e 7.959 no Novo Testamento.

Ø  O livro maior é o dos Salmos, com 150 capítulos.

Ø  O livro menor é 2João.

Ø  O maior capítulo é o Salmo 119.

Ø  O menor capítulo é Salmo 117.

Ø  O capítulo 37 de Isaías e o 19 de 2Reis são iguais.

Ø  O maior versículo está em Ester 8:9.

Ø  O menor versículo está em Êxodo 20:13 na ARC; em Lucas 20:30 na TRBR; em Jó 3:2 na ARA. Como se vê, depende da Versão.

Ø  O texto central é o Salmos 118:8.

O tema central da Bíblia

Jesus Cristo é o tema central da Bíblia. Podemos resumir todo o Antigo Testamento numa frase: Jesus virá; e o Novo Testamento noutra frase: Jesus já veio (é claro, como Redentor). Assim sendo, as Escrituras sem a pessoa de Jesus seriam como a física sem a matéria e a matemática sem os números. Já imaginou um cristão sem a Bíblia? E nós irmãos, o que estamos fazendo, para difundir a Bíblia, o livro que nos salvou, como mandou o Senhor Jesus? - "E disse-lhes: Ide por todo o mundo, e pregai o evangelho a toda criatura” (Mc.16:15).

Texto áureo da Bíblia

João 3:16 – “Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.

A divisão em capítulos

Foi introduzida pelo professor universitário parisiense Stephen Langton, em 1227 d.C, que viria a ser eleito bispo de Cantuária pouco tempo depois.

A divisão em versículos

Foi introduzida em 1551, pelo impressor parisiense Robert Stephanus. Ambas as divisões tinham por objetivo facilitar a consulta e as citações bíblicas, e foi aceita por todos, incluindo os judeus.

Escritores da Bíblia

A existência da Bíblia, abrangendo seus escritores, sua formação, composição, preservação e transmissão, só pode ser explicada como milagre de Deus, ou melhor, Deus é seu autor. Foram cerca de quarenta os escritores da Bíblia. Deste modo, a Palavra Escrita de Deus foi nos dada por canais humanos, assim como o foi a Palavra Viva – Cristo (Ap.19:13). Esses homens pertenceram às mais variadas profissões e atividades, escreveram e viveram distantes uns dos outros em época e condições diferentes. Levaram 1500 anos para escrevê-la. Apesar de todas estas dificuldades, a Bíblia não contém erros nem contradições. Há sim dificuldades na compreensão, interpretação, tradução, aplicação, mas isso do lado humano, devido a nossa incapacidade em todos os sentidos.

2. O Cânon da Bíblia

Conforme argumenta Norman L. Geisler, o significado original do termo “cânon” remete aos antigos gregos, que o usavam em sentido literal: um “kanon” era uma vara, uma régua, um cajado ou uma vara de medição. O termo grego “kanon” deriva, provavelmente, do hebraico “Kaneh” (caniço, ou vara de medir), um termo do Antigo Testamento que significa vara (Êx.40:3; 42:16). Esse conceito literal proporcionou a base para o uso estendido posteriormente da palavra “kanon”, cujo significado é “padrão”, “norma”. Já no grego pré-cristão, a palavra “kanon” tinha um sentido não literal, como ocorre no Novo Testamento. Em 2Corintios 10:13-16, o sentido é de “esfera de ação ou de influência”. Gálatas 6:16 chega mais perto do significado teológico final da palavra, quando Paulo afirma: “Que paz e misericórdia estejam sobre aqueles que andarem conforme essa norma [Kanon]”.

Teologicamente, o cânon está fechado. Deus inspirou somente um número limitado de livros, que foram, todos eles, concluídos até o final do período apostólico (séc.1 d.C.). Deus costumava falar pelos profetas do Antigo Testamento, mas nos “últimos dias” falou por meio de Cristo (Hb.1:1) e pelos apóstolos a quem capacitou para realizar “sinais” especiais (milagres). Contudo, como a era apostólica terminou com a morte dos apóstolos (Atos 1:22), e como ninguém desde os tempos apostólicos apresentou os “sinais de um verdadeiro apóstolo” (2Co.12:12) pelos quais pudesse ressuscitar os mortos (Atos 20:10-12) e realizar outros feitos sobrenaturais incomparáveis (Atos 3:1-10; 28:8,9), pode-se concluir que a revelação de Deus do “último dia” está completa (veja Atos 2:19,20). Isso não significa que as visitações de Deus tenham encerrado, visto que ainda há muitas outras coisas que precisam ser cumpridas (veja Atos 2:19,20). Tampouco significa que não haverá nenhum novo entendimento da verdade divina depois do século 1. Significa simplesmente que não há nenhuma nova revelação para a Igreja. Na verdade, isso não implica necessariamente que não tenha havido milagres desde o século 1. Atos sobrenaturais serão possíveis, pois Deus está sempre pronto a realizar segundo a sua vontade. Não se trata do fato de que milagres cessaram com os apóstolos, mas da dotação especial de realizar milagres que um profeta ou apóstolo tinha, a ponto de poder declarar, assim como Moisés, Elias, Pedro ou Paulo, que tinha uma nova revelação de Deus. Um profeta ou apóstolo como esses poderia respaldar sua declaração dividindo o mar, fazendo descer fogo do Céu ou ressuscitando os mortos. Tratava-se de dons especiais concedidos aos profetas e apóstolos, e que estão ausentes dos que não receberam uma nova revelação (Atos 2:22; Hb.2:3,4).

Historicamente, o cânon está fechado e compreende os 39 Livros do Antigo Testamento e os 27 Livros escritos do Novo Testamento, existentes nas nossas tradicionais Bíblias, os quais são necessários para a fé e prática dos crentes de todas as gerações. Nada pode ser acrescentado ou retirado das Escritura Sagradas canônicas (Ap.22:18,19).

Num sentido real, Cristo é a chave da inspiração e da canonização das Escrituras. Foi Ele quem confirmou a inspiração do cânon hebraico do Antigo Testamento, e foi Ele quem prometeu que o Espírito Santo guiaria os apóstolos a toda a verdade. O cumprimento dessa promessa resultou na redação, recepção e coleção do Novo Testamento.

3. Os dois Testamentos bíblicos

Além de a Bíblia ser um “biblos”, ou um livro, o fato mais óbvio é que ela está dividida em duas partes denominadas Testamentos: Antigo Testamento e Novo Testamento. O termo hebraico para testamento é “berith”, que significa “aliança, ou contrato, ou ainda acordo entre duas partes”. O termo grego “diatheke” é geralmente traduzido por “testamento”. A versão grega do Antigo Testamento, a Septuaginta (LXX), traduz o termo hebraico “berith” por “diatheke”, mostrando dessa forma a derivação do termo grego.

O Antigo Testamento foi chamado primeiramente de Aliança nos dias de Moisés (Êx.24:8). Mais tarde, Jeremias anunciou que Deus faria uma “nova aliança” com seu povo (Jr.31:31-34), o que Jesus afirmou estar realizando na última Ceia (Mt.26:28; cf.1Co.11:23-25; Hb.8:6-8). Portanto, para os cristãos a primeira parte da Bíblia é chamado de “Antiga Aliança” (Testamento), e a segunda parte de “Nova Aliança”. A relação entre as duas Alianças está bem sintetizada na célebre declaração de Santo Agostinho: “...o Antigo Testamento revelado no Novo; o Novo oculto no Antigo...”. Ou, como disse outro autor, “o Novo está contido no Antigo, e o Antigo está explicado no Novo”. Para o cristão, Cristo é o tema das duas alianças (cf. Hb.10:7; Lc.24:27,44; João 5:39), conforme pode ser visto no seguinte quadro:

No Antigo Testamento, Cristo está:

No Novo Testamento, Cristo está:

  • Nas sobras
  • Em essência
  • Em imagens
  • Em pessoa
  • Em tipos
  • Em verdade
  • Em rituais
  • Na realidade
  • Latente
  • Patente
  • Profetizado
  • Presente
  • Revelado implicitamente
  • Revelado explicitamente

Fonte: Livro Introdução Geral à Bíblia. Norman L., Gleisler

II. O ANTIGO TESTAMENTO

1. Os Livros do Antigo Testamento

A classificação dos livros do Antigo Testamento, tal qual conhecemos e utilizamos nos dias de hoje em nossas Bíblias, se divide em 39 livros, e obedece a forma grega. Esses livros estão divididos em 4 classes: LEI, HISTÓRIA, POESIA, PROFECIA.

Ø LEI (Torá). Corresponde aos cinco primeiros livros do Antigo Testamento; são eles: Gênesis, Êxodo, Levíticos, Números, Deuteronômio; esses cinco livros são chamados Pentateuco. Tratam da criação, da formação do povo de Israel e da Lei.

Ø HISTÓRIA. 12 livros - Josué, Juízes, Rute, 1 e 2 Samuel, 1 e 2 Reis, 1 e 2 Crônicas, Esdras, Neemias e Ester. Contém a história do povo de Israel.

Ø POESIA: cinco livros - Jó, Salmos, Provérbios, Eclesiastes e Cânticos dos Cânticos (Cantares). São chamados poéticos devido ao gênero do seu conteúdo e não por outra razão.

Ø PROFECIA. 17 livros - de Isaías a Malaquias. Esses 17 livros estão subdivididos em dois grupos:

·    PROFETAS MAIORES. Cinco livros: Isaías, Jeremias, Lamentações de Jeremias, Ezequiel e Daniel.

·    PROFETAS MENORES. 12 livros: Oséias, Joel, Amós, Obadias, Jonas, Miquéias, Naum, Habacuque, Sofonias, Ageu, Zacarias e Malaquias.

Os nomes "maiores” e “menores" referem-se ao volume de matéria dos livros e extensão do ministério profético. 

No decorrer dos séculos, a Bíblia foi subdividida em seções e seus livros foram organizados em diferentes formas. A Bíblia hebraica veio a ser dividida em três partes – Lei, Profecias e Escritos -, assim classificadas de acordo com a posição oficial do autor. Contudo, começando pela Septuaginta e passando pelas traduções em latim e inglês moderno, o Antigo Testamento passou a ser organizado em uma estrutura temática quádrupla.

As Escrituras hebraicas foram traduzidas para o grego em Alexandria, no Egito (c.250 a 150 a.C.). Essa tradução, conhecida como Septuaginta (LXX), introduziu algumas mudanças básicas no formato dos livros: alguns deles foram reclassificados, outros foram reagrupados e ainda outros foram renomeados. A tradição alexandrina organizou o Antigo Testamento de acordo com o assunto, que é a base da classificação atual dos cincos livros da Lei, doze livros de história, cinco livros de poesia e dezessete livros de profecia.

O quadro a seguir mostra essa organização, que apresenta o mesmo conteúdo, porém com um número de livros diferentes da lista hebraica.

LEI (PENTATEUCO)

POESIA

1. Gênesis

1. Jó

2. Êxodo

2. Salmos

3. Levítico

3. Provérbios

4. Números

4. Eclesiastes

5. Deuteronômio

5. Cântico dos Cânticos

HISTÓRIA

PROFETAS

Maiores

Menores

1. Josué

1. Isaías

1.Oseias

2. Juízes

2. Jeremias

2. Joel

3. Rute

3. Lamentações

3. Amós

4. 1Samuel

4. Ezequiel

4.Obadias

5. 2Samuel

5. Daniel

5. Jonas

6. 1Reis

 

6. Miqueias

7. 2Reis

7. Naum

8. 1Crônicas

8. Habacuque

9. 2Crônicas

9. Sofonias

10. Esdras

10. Ageu

11. Neemias

11. Zacarias

12. Ester

12. Malaquias

Fonte: Introdução à Bíblia – Norman L GLEISLER

Na Lei, é lançado o fundamento para Cristo; nos Livros Históricos, as nações fincam raízes em preparação para Cristo; nos Livros Poéticos, o povo olha para o alto e aspira a Cristo; nos Livros Proféticos, olham para frente na expectativa de Cristo.

A LEI contempla a vida moral de Israel. A HISTÓRIA registra sua vida nacional. A POESIA revela sua vida espiritual. A PROFECIA ilustra sua vida e expectativa proféticas ou messiânicas.

2. Canonicidade do Antigo Testamento

Segundo o teólogo Norman L. Gleisler, os critérios utilizados para a admissão dos Livros Sagrados no cânon do Antigo Testamento foram muito discutidos. O Cânon do Antigo Testamento foi concluído provavelmente em torno de 400 a.C., e talvez por volta de 200 a.C., e os Livros que haviam passado por esse processo de canonização começaram a tomar a forma alternativa de uma classificação tripartite: Lei, Profetas e Escritos. Trinta e quatro, dos 39 livros do Antigo Testamento, são aceitos por todos os cristãos como parte do cânon; são os chamados “Homologoumena” (concordância). Não houve questionamento ou dúvidas a seu respeito. Foram reconhecidos não apenas pelas primeiras gerações, mas também pelas que as sucederam. Os outros cinco Livros, chamados “Antilegomena” (falar contra) foram objeto de contestação por alguns, mas mantiveram seu lugar no cânon. Estes cinco Livros são: Cântico dos Cânticos, Eclesiastes, Ester, Ezequiel e Provérbios. Eles foram primeiramente incluídos no cânon e só depois contestados. Isto é, esses livros canônicos tiveram seu caráter e/ou informações questionados posteriormente por rabinos.

a) Cântico dos Cânticos. O motivo principal que levou esse livro a ser contestado é que pareceu “sensual” para alguns. A escola de Shammai (séc. 1 d.C.) tinha dúvidas de sua canonicidade, mas, por fim, foi aceito pelo rabino Akiba ben Joseph (c.50-132). Ele afirmou:

“Deus me livre! Nenhum homem em Israel jamais colocou em dúvida Cântico dos Cânticos [a ponto de dizer] que esse Livro não torna as mãos impuras [isto é, que não é canônico], porque todas as eras não valem do dia em que Cântico dos Cânticos foi dado a Israel; pois todos os Escritos são santos, mas Cântico dos Cânticos é o Santo dos Santos”.

Conforme H. H. Rowley, se as dúvidas giravam em torno de um suposto caráter sensual, elas se baseavam numa interpretação equivocada. Contudo, é perfeitamente possível que Deus tenha colocado esse Cântico no cânon para nos ensinar a pureza e a santidade do estado do matrimônio que Ele mesmo estabeleceu. Sejam quase forem as dúvidas sobre a intepretação do Cântico, não deve haver dúvida alguma sobre sua inspiração e consequente canonização.

b) Eclesiastes. Uma das principais objeções a esse Livro era que parecia “cético”. Alguns o têm chamado de o “Cântico do Ceticismo”. Contudo, não há necessidade de chegar a essa conclusão sobre o Livro. O Eclesiastes em si chega a uma conclusão espiritual: “Teme a Deus e obedece aos seus mandamentos; porque isso se aplica a todo homem” (Ec.12:12). Poderá haver alguma dúvida sobre o homem ”debaixo do sol”, mas não precisa haver dúvida alguma sobre o ensino do Livro, que vai “acima e além do sol” e vem como “palavras de verdade [...] dadas pelo único Pastor” (Ec.12:1011).

c) Ester. Em virtude da ausência notória do nome de Deus, esse Livro teve certa dificuldade de manter sua posição no cânon hebraico. Segundo Norman L. Gleisler, o ponto central do desafio era o fato de que o Livro parecia “não espiritual”. A pergunta fundamental que se fez foi a seguinte: “Como esse Livro pode ser Palavra de Deus se nem mesmo menciona o nome de Deus?”. Há duas explicações possíveis que devem ser mencionadas aqui: Alguns postularam que como os judeus do exílio persa ”não estavam mais na linha teocrática, por assim dizer, o nome do Deus da aliança não está associado a eles”; outros acharam que a omissão do nome de Deus era intencional, para proteger o Livro de plágio pelos pagãos e para evitar a substituição do nome de Deus por um deus pagão. Em apoio a essa alegação, W.G.Secroggie observa que o nome de Jeová (YHWH) pode ser encontrado quatro vezes em forma de acróstico no Livro, e de um modo e em lugares tais que o colocariam além do âmbito da mera probabilidade. Seja como for, a ausência do nome de Deus é mais do que compensada pela presença do seu poder e de sua graça na libertação do seu povo, fato que confere valor canônico ao Livro (cf. Ester 4:14; 9:20-22).

d) Ezequiel. Este Livro foi questionado por alguns por causa de seus ensinos aparentemente “antimosaicos”. A escola de Shammai achava que o ensino do Livro não estava de acordo com a Lei mosaica, e que os primeiros dez capítulos apresentavam uma tendência gnóstica. Contudo, não foram dados exemplos específicos que contradissessem efetivamente a Torá. Se houvesse contradições concretas, então é claro que o Livro não poderia ser considerado canônico. Portanto, a exemplo de outros livros contestados, os argumentos giravam em torno da interpretação histórica, conforme observa Beckwith:

As evidências em prol da canonicidade de Ezequiel são tão amplas e tão antigas que o Livro se tornou motivo de embaraço para os que defendem a perspectiva comum sobre a data de fechamento do cânon. Ezequiel certamente se apresenta como profeta comissionado por Deus e o Livro é provavelmente ou certamente reconhecido como profético, bíblico ou divino. Suas revelações e predições são endossadas, sua autoria profética é reconhecida, é citada por meio de fórmulas tradicionais de citação das Escrituras e foi incluído “na Lei e nos Profetas”.

e) Provérbios. Segundo Norman L. Gleisler, a polêmica em torno desse Livro decorre do fato de que ele é “ilógico” (contraditório em si mesmo). Essa acusação fica claro no Talmude, que diz: “Também procuraram ocultar o Livro de Provérbios, porque suas palavras contradiziam umas às outras”. A suposta contradição é encontrada em Provérbios 26:4,5, em que a exortação consiste a um só tempo em “responder ao insensato de acordo com a sua insensatez” e em não fazê-lo. Contudo, conforme os rabinos têm observado, o sentido evidente pretendido é que há ocasiões em que se deve responder ao insensato e ocasiões em que não se deve fazê-lo. Como as afirmações aparecem em versículos sucessivos em forma de dístico (máxima expressão em dois versos), parece que comportam um impacto implícito semelhante à expressão atual “por um lado, por outro lado”. Seja como for, os demais versículos apresentam razões diferentes para os dois tipos de conselho, respectivamente; e, em decorrência disso, não há contradição que impeça a canonicidade.

Segundo o pr. Douglas, “a conclusão da erudição bíblica é de que os Livros canônicos foram divinamente revelados e que, na sua boa providência, Deus fez que seu povo reconhecesse e recebesse a sua Palavra. Nessa perspectiva, existem três fatores basilares na avaliação de um Livro canônico, a saber:

a)    Inspiração por Deus, que atesta se o Livro é inspirado pelo Espírito Santo (Ne.9:30; Zc.7:12; 2Pd.1:21).

b)    Reconhecimento do povo de Deus, que atesta se o livro era aceito como autêntico por seus primeiros leitores (Êx.24:2,7; Dn9:2).

c)     Preservação pelo povo de Deus, que atesta se o Livro era conservado como Palavra de Deus (Dt.31:24-26; Dn.9:2).

A confirmação desses elementos revela que, desde o início, os livros do Antigo Testamento foram recebidos e guardados como inspirados e autorizados por Deus, dotados de veracidade e de autoridade”.

Podemos, portanto, confiar na autoridade do Antigo Testamento, pois sua canonicidade é irrefutavelmente atestada pelo Senhor Jesus e pelos apóstolos (Mt.5:17,18; Lc.24:27; Rm.5:12; 1Co.10:1-5).

3. Particularidades do Antigo Testamento

Uma das particularidades do Antigo Testamento, segundo o pr. Douglas Baptista, é que quase a totalidade dos Livros foi escrito em hebraico, chamado na Bíblia de língua de Canaã (Is.19:18). Algumas porções foram escritas em aramaico, uma espécie de dialeto que deu origem à língua árabe. Destaca-se que as descobertas dos rolos do Mar Morto (entre 1947 e 1964 d.C.) confirmam a preservação e a suficiência dos textos do Antigo Testamento. Esequias Soares narra que, com exceção ao livro de Ester, todos os demais livros estão representados e confirmados pelos mais de 800 rolos encontrados nas 11 cavernas de Qumran, muitos deles vindo da Babilônia e do Egito, e alguns desses manuscritos ainda eram escritos com grafia do hebraico arcaico.

O último Livro canônico do Antigo Testamento foi o do profeta Malaquias, que foi concluído antes do ano 430 a.C.; desde então, nada mais pode ser acrescido ao cânon do Antigo Testamento. E, conforme o teólogo Norman Gleisler, para facilitar a tarefa de citar a Bíblia, em 1.227 d.C., o Antigo Testamento foi dividido em capítulos e, por volta de 1.445 d.C., foi dividido em versículos.

III. O NOVO TESTAMENTO

1. Os Livros do Novo Testamento

Seus 27 livros estão divididos em quatro classes: BIOGRAFIA, HISTÓRIA, DOUTRINA E PROFECIA.

a) BIOGRAFIA. São os quatro Evangelhos. A palavra Evangelho significa "Boas Novas". Cada um dos quatro evangelhos do Novo Testamento narra a história da vida, morte e ressurreição de Jesus Cristo. Esses evangelhos são composições anônimas que levam o nome dos seus autores no título. Todos os quatro evangelhos foram reunidos logo após o Evangelho de João ter sido escrito. A coleção de quatro livros era conhecida como "O Evangelho" no começo do segundo século. Assim, o cristianismo primitivo sempre aceitou esses evangelhos porque conheciam seus autores. São eles:

a.1) Evangelho de Mateus. Este evangelho começa com a genealogia de Jesus e a história do seu nascimento, e termina com o comissionamento dos discípulos por Jesus depois de ressuscitado. O principal objetivo do evangelho de Mateus é mostrar para os judeus que Jesus é o Messias. Este Evangelho era considerado o manifesto da Igreja de Jerusalém e, por conseguinte, o documento fundamental do início da fé cristã.

Mateus apresenta Jesus como o cumprimento da esperança profética de Israel. Ele mostra o cumprimento das profecias do Antigo Testamento, a saber, o modo como Jesus nasceu (Mt.1:22,23), o lugar do seu nascimento (Mt.2:5,6), o seu regresso do Egito (Mt.2:15), sua residência em Nazaré (Mt.2:23), o precursor messiânico (Mt.3:1-3), o território principal do seu ministério público (Mt.4:14-16), o seu ministério de cura (Mt.8:17), a sua missão como o servo de Deus (Mt.12:17-21), os seus ensinos por parábolas (Mt.13:34,35), a sua entrada triunfal em Jerusalém (Mt.21:4,5), a sua prisão (Mt.26:50,56).

a.2) Evangelho de Marcos. Dentre os quatro Evangelhos, Marcos é o relato mais conciso do “princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus” (Mc.1:1). Embora o autor não se identifique pelo nome no livro, o testemunho primitivo e unânime da Igreja é que João Marcos foi quem o escreveu. Ele foi criado em Jerusalém e pertenceu à primeira geração de cristãos (Atos 12:12). Teve a oportunidade ímpar de colaborar no ministério de três apóstolos: Paulo (Atos 13:1-13; Cl.4:10; Fm.24), Barnabé (Atos 15:39) e Pedro (1Pd.5:13). Segundo os estudiosos, Marcos escreveu o seu Evangelho em Roma e destinou-o aos crentes de Roma. É possível que seja o primeiro dos quatro Evangelhos escritos.

a.3) Evangelho de Lucas. O Evangelho segundo Lucas é o primeiro dos dois livros endereçados a uma pessoa por nome Teófilo (Lc.1:3; Atos 1:1). Embora o autor não se identifique pelo nome em nenhum dos dois livros, o testemunho unânime do cristianismo primitivo e as evidências internas indicam a autoria de Lucas nos dois casos.

Lucas escreveu este Evangelho aos gentios para proporcionar-lhes um registro completo e exato de “tudo que Jesus começou, não só a fazer, mas a ensinar, até ao dia em que foi recebido em cima” (Atos 1:1b, 2a).

a.4) Evangelho de João. Este Evangelho é ímpar entre os quatro Evangelhos. Relata muitos fatos do ministério de Jesus na Judéia e em Jerusalém que não se acham nos Sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas), e revela mais a fundo o mistério da pessoa de Jesus. O autor identifica-se indiretamente como discípulo “a quem Jesus amava” (João 13:23; 19:26; 20:2; 21:7,20). Segundo testemunhos muito antigos, os presbíteros da Igreja da Ásia menor pediram ao venerável ancião e apóstolo João, residente em Éfeso, que escrevesse este “Evangelho espiritual” para contestar e refutar uma perigosa heresia concernente à natureza, pessoa e deidade de Jesus, propagada por falsos mestres. O Evangelho Segundo João continua sendo para a Igreja uma grandiosa exposição teológica da “Verdade”, como a temos personalizada em Jesus Cristo.

b)    HISTÓRICO: ATOS DOS APÓSTOLOS. Este livro é a continuação do Evangelho de Lucas (Atos 1:1,2) e conta a história de como a mensagem cristã foi anunciada em Jerusalém, Samaria e nas demais regiões do império Romano (Atos 1:8). Nesse livro, destacam-se duas pessoas: Paulo e Pedro. Pedro dirige o trabalho cristão em Jerusalém, Samaria (Atos 1:12 a 8:25), Lida, Jope e Cesaréia (Atos 9:32 a 11:18). Esse livro também trata da conversão do apóstolo Paulo (Atos 9) e de suas viagens missionárias pelo Império Romano (Atos 13-28).

Embora o livro não identifique nominalmente o autor, o testemunho unânime do cristianismo primitivo e a evidência interna confirmatória deste livro denotam que ele foi escrito por Lucas, “o médico amado” (Cl.4:14).

Atos abrange, de modo seletivo, os primeiros trinta anos da história da Igreja. Como historiador eclesiástico, Lucas descreve, em Atos, a propagação do Evangelho, partindo de Jerusalém até Roma. Ele menciona nada menos que 32 países, 54 cidades, 9 ilhas do Mediterrâneo, 95 diferentes pessoas e uma variedade de membros e funcionários do governo com seus títulos precisos. A arqueologia continua a confirmar a admirável exatidão de Lucas em todos os seus pormenores. Como teólogo, Lucas descreve com habilidade a relevância de várias experiências e eventos dos primeiros anos da Igreja. O livro mostra que o segredo do progresso da Igreja é a plenitude do Espírito Santo.

c)    DOUTRINA. Os livros doutrinários são vinte e um. A maioria dos livros compõem-se de cartas escritas para certos grupos de crentes. Com frequência abordam problemas específicos que alguns daqueles grupos estavam enfrentando, ao procurarem seguir a maneira de viver cristã. Ao escrever a esses crentes, os autores desses livros explicaram as grandes verdades a respeito de Jesus Cristo e Sua obra, se ainda não as haviam compreendido. Os autores sagrados igualmente descreveram a relação entre os crentes e Cristo, e como os crentes devem viver como resultado disso. As poderosas mensagens que Deus inspirou que escrevessem não visavam apenas aos primeiros discípulos, mas também "todos os que em todo lugar invocam o nome de nosso Senhor Jesus Cristo" (1Co.1:2).

Podem ser classificados da seguinte forma:

c.1) Epístolas Paulinas. As epístolas paulinas são Cartas escritas pelo apóstolo Paulo. Essas Epístolas/Cartas tratam de pontos teológicos importantes para o desenvolvimento da doutrina cristã no princípio da Igreja. Geralmente, essas Epístolas foram escritas tanto para indivíduos, quanto para as primeiras comunidades cristãs. São elas: Romanos; 1Coríntios; 2Coríntios; Gálatas; Efésios; Filipenses; Colossenses; 1Tessalonicenses; 2Tessalonicenses; 1Timóteo; 2Timóteo; Tito e Filemon. São treze maravilhosas Cartas.

c.2) Epístolas Universais. Compreende as Epístolas escritas para a Igreja em geral. São elas:

·         Epístola de Tiago - Escrito por Tiago, irmão de Jesus e de Judas.

·         Primeira Epístola de Pedro - Escrita por Pedro.

·         Segunda Epístola de Pedro - Escrita por Pedro.

·         Primeira Epístola de João - Escrita por João.

·         Segunda Epístola de João - Escrita por João.

·         Terceira Epístola de João - Escrita por João.

·         Epístola de Judas - Escrita por Judas, o irmão de Jesus e de Tiago.

·    Hebreus. Foi escrito principalmente para os cristãos judeus que estavam sob perseguição e esmorecimento. O escritor procura fortalecê-los na fé em Cristo, demonstrando cuidadosamente a superioridade e finalidade da revelação e redenção da parte de Deus em Jesus Cristo. Sua autoria é incerta. A ciência moderna rejeita ter sido escrita por Paulo. Até mesmo entre os pais da Igreja sua autoria foi debatida. Orígenes escreveu: "Os homens dos tempos antigos afirmaram que Paulo foi o autor, mas quem escreveu essa Epístola apenas Deus sabe". O que se sabe é que ela foi escrita na segunda geração de cristãos (Hb.2:1-4) e após um intervalo considerável de tempo depois da conversão dos destinatários (Hb.5:12).

d)    PROFETICO: APOCALIPSE. O livro de Apocalipse é uma profecia (Ap.1:3; 22:7,10,18-19) que assegura a vitória de Cristo e da Igreja sobre todos os seus adversários. Embora haja profecias em quase todos os livros do Novo Testamento, somente o Apocalipse pode ser considerado um documento rigorosamente profético. Aliás, até o seu título é profético; segundo estudiosos, a palavra "Apocalipses" é composta de duas partes: “Apo”, que significa "dentro para fora"; e “kalupsis”, que significacobertura ou véu”. “Apocalupsis”, portanto, significa tirar o véu ou descobrir o que estava oculto. A ordem de Deus é: "Não seles as palavras da profecia deste livro, porque o tempo está próximo" (Ap.22:10). Quando João diz “o tempo está próximo”, está insistindo com seus leitores para que estejam prontos para o Juízo Final e o estabelecimento do Reino de Deus em sua forma plena. Não sabemos quando esses eventos ocorrerão, mas devemos estar sempre preparados, pois eles acontecerão rapidamente, e não nos será dada outra oportunidade para mudar de lado.

Os 27 livros do Novo Testamento foram escritos em diversos lugares e por autores que classificaram seus Escritos como inspirados, ao lado dos Escritos do Antigo Testamento. Entretanto, ao contrário do Antigo Testamento, o Novo foi produzido em um curto espaço de tempo, durante menos de um século. Esses livros eram respeitados, colecionados e circulavam no princípio da Igreja como Escrituras Sagradas. O fato desses livros terem sido lidos, citados, colecionados, e passados de mão em mão dentro das igrejas do início do cristianismo, assegura que a Igreja Primitiva os tinha como proféticos ou divinamente inspirados desde o começo.

2. Canonicidade do Novo Testamento

Segundo argumento do teólogo Norman L. Gleisler, o fator determinante na canonização do Novo Testamento foi a inspiração, e o teste primordial era a apostolicidade. Se era possível determinar que um livro desfrutava de autoridade apostólica, não haveria razão para questionar sua autenticidade ou veracidade. Na terminologia do Novo Testamento, a Igreja foi “edificada sobre o fundamento dos apóstolos e profetas” (Ef.2:20), a quem Cristo havia prometido guiar a “toda a verdade” (João 16:13) por intermédio do Espírito Santo. Diz-se que a Igreja de Jerusalém perseverava no “ensino dos apóstolos” (Atos 2:42).

O termo “apostólico” conforme foi usado para o teste de canonicidade não significa necessariamente “autoria apostólica”, ou “aquilo que foi preparado sob direção dos apóstolos”, a menos que a palavra “apóstolo” seja tomada em seu sentido não técnico, significando alguém além dos doze apóstolos ou Paulo. Nesse sentido não técnico, Barnabé é chamado de apóstolo (Atos 14:14), assim como Tiago (Gl.1:19) e, aparentemente, mais alguns (Rm.16:7; 2Co.8:23; Fp.2:25).

Não parece ser necessário pensar em Marcos e Lucas como auxiliares dos apóstolos, ou dizer que o autor de Tiago era um apóstolo, para não falar de Judas ou do autor de Hebreus. Na verdade, o autor de Hebreus nega que é apóstolo observando que a mensagem de Cristo “foi anunciada a nós [leitores e autor] por aqueles [os apóstolos] que o ouviram” (Hb.2:3). É mais inteligível aceitar o argumento de alguns teólogos e da maior parte dos protestantes de que é a autoridade apostólica, ou a aprovação apostólica, o teste principal para a canonicidade, e não simplesmente a autoria apostólica.

Convém lembrar, porém, que o cânon foi concluído na realidade quando o último livro do Novo Testamento foi escrito. Contudo, antes de fechar o cânon do Novo Testamento, houve a contestação de 07 Livros. Um Livro contestado é aquele que, embora preservado, é objeto de dúvidas, e não simplesmente um Livro que não é citado ou incluído em determinada lista. Estes Livros contestados, classificados como Antilegomena, foram: Hebreus, Tiago, 2Pedro, 2 e 3João, Judas e Apocalipse (Extraído do Livro “Introdução geral à Bíblia”, de Norman L. Gleisler).

-Hebreus. Esse Livro foi questionado por se tratar de obra “anônima”. No Oriente, onde Paulo é considerado seu autor, o Livro foi acolhido imediatamente. No Ocidente, o processo foi mais lento, por causa da incerteza no tocante à sua autoria apostólica e, possivelmente, porque indivíduos da seita montanista apelaram a Hebreus para comprovar suas doutrinas errôneas. No século 4, graças à influência de Jerônimo e Agostinho, o Ocidente finalmente reconheceu a canonicidade da Epístola. Outra razão pela qual o Ocidente demorou a se decidir se deve à sua ênfase na autoria apostólica, e não na autoridade apostólica, como o teste correto para a canonicidade.

-Tiago. Esse livro teve sua veracidade questionada, embora houvesse quem duvidasse também de sua autoria. O suposto conflito com Paulo em torno da justificação pela fé deteve sua aceitação plena até a época de Eusébio. Por causa do trabalho de Orígenes, Eusébio (que era pessoalmente a favor de Tiago), Jerônimo e Agostinho, o Ocidente por fim reconheceu a natureza complementar do Livro com as cartas de Paulo e, portanto, sua canonicidade.

-2Pedro. A genuinidade de 2Pedro foi questionada. Na verdade, nenhum outro Livro do Novo Testamento tem sido questionado de forma tão persistente quanto esse. Jerônimo afirmou que a hesitação em torno da aceitação de 2Pedro se devia à diferença de estilo em comparação com 1Pedro. Se essa característica se devia a um amanuense diferente, conforme pensava Jerônimo, talvez jamais se saiba ao certo. Está claro, porém, que hoje há amplas evidências que confirmam que essa Carta é acertadamente atribuída ao apóstolo Pedro.

-2 e 3João. Esses Livros também tiveram sua genuinidade questionada. Dada à sua natureza privada e circulação limitada, não tiveram uma aceitação generalizada. O autor identifica-se não como apóstolo, mas como “presbítero”, outro fato que impediu sua aceitação. Apesar de todas essas dificuldades, as duas Cartas foram mais amplamente reconhecidas do que 2Pedro, tendo sido reconhecidas pelo Cânon Muratoriano e também por alguns pais da Igreja do século 2. Além disso, a semelhança de estilo e de pensamento com 1João e o uso de “presbítero” pelos apóstolos em outras ocasiões (1Pd.5:1), favorecem fortemente a autoria joanina.

-Judas. A contestação desse Livro se deu em torno de sua autenticidade. A maior parte dos que questionaram Judas o fizeram com base em supostas referências ao pseudoepigráfico Livro de Enoque (vv.14,15) e possivelmente também à “Assunção de Moisés” (v.9). Orígenes sugere isso, e Jerônimo afirma especificamente que essa é a razão de Judas ter sido contestado. É interessante observar que Tertuliano defendeu que Judas estava imbuído de autoridade precisamente por causa da referência a Enoque. Contudo, a explicação que mais tem favorecido o Livro é que a citação a Enoque não requer a aprovação ao Livro como um todo, estendendo-se unicamente àquelas porções que ele utiliza para o seu propósito. Essa situação não é materialmente diferente das referencias que Paulo fez aos poetas pagãos (Atos 17:28; 1Co.15:33; Tt.1:12).

-Apocalipse. O Apocalipse foi incluído nos “Antilegomena” porque teve sua autenticidade contestada. A doutrina do quiliasmo (milenarismo) foi o ponto central da controvérsia, que durou mais do que qualquer outro livro do Novo Testamento. É curioso que Apocalipse tenha sido um dos primeiros livros a ser reconhecido nos escritos dos pais apostólicos aos quais temos acesso e um dos últimos a ser questionado. São compreensíveis as evidências favoráveis à recepção imediata de Apocalipse no século 1, uma vez que as “sete igrejas” (Ap.2-3), às quais o Livro foi endereçado, naturalmente haveriam de querer que uma obra associada a elas tão diretamente fosse preservada. Por volta de meados do século 3, Dionísio, bispo de Alexandria, levantou sua voz influente contra o Apocalipse. Suas ideias prevaleceram passando pelo tempo de Eusébio de Cesareia até a época de Atanásio e do Concílio de Cartago (397 d.C.) quando essa tendência foi revertida. Parece claro que não se tratava de uma questão de inspiração, mas de interpretação e de associação com ênfases doutrinárias especificas que levaram à contestação. Logo que isso ficou claro, a autenticidade apostólica autêntica de Apocalipse foi confirmada.

Em suma, o teste principal de canonicidade nos tempos do Novo Testamento consistia na autoridade apostólica e profética. Os escritos que chegaram às Igrejas Locais (ou individuais) eram lidos, difundidos, colecionados e até citados como parte do cânon das Escrituras. Esses escritos complementavam a Palavra inspirada de Deus e constituíam parte integral dela juntamente com as Escrituras previamente reconhecidas do Antigo Testamento.

Deus é a fonte da canonicidade e em sua providência ele usou vários estímulos para concluir o reconhecimento e a ratificação de todos os 27 livros do Novo Testamento. Esses estímulos – práticos, teológicos e de natureza política – foram instrumentais na coleção e na transmissão das Escrituras do Novo Testamento.

3. Particularidades do Novo Testamento

Desde o encerramento do cânon do Novo Testamento, os cristãos só reconhecem 27 Livros. Por volta do ano 100 da Era Cristã o Novo Testamento estava completo, ou substancialmente completo, sendo que a maioria dos livros já existia de 20 a 40 anos antes dessa data. A lista mais antiga dos livros do Novo Testamento apareceu em 367 d.C., numa carta de Atanásio, bispo de Alexandria. A ordem era: Evangelhos, Atos, epístolas gerais, epístolas paulinas e Apocalipse. O cânon do Novo Testamento foi oficialmente reconhecido como escritura sagrada no Concílio de Cartago em 397. Esse concílio decretou que nada devia ser lido na Igreja com o nome de Novo Testamento, a não ser os nossos 27 livros canônicos.

Outra particularidade é que todos os 27 Livros foram escritos em grego koiné, um dialeto comum e presente por toda a cultura de fala grega e que muito auxiliou na propagação do Evangelho nos primórdios do cristianismo (Atos 19:10). Algumas expressões, mesmo redigidas no vernáculo grego, possuem significado em aramaico. Dentre elas, citamos: “Talitá cumi”, que significa: “menina, levanta-te” (Mc.5:41); “Aba Pai”, que significa: Papai, meu pai (Mc.14:36); “Eloí, Eloí, lemá sabactâni?”, que significa: “Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” (Mc.15:34).

Outra particularidade que destacamos é que estes Livros, conforme se encontram em nossas Bíblias, não seguem, em sua maioria, a ordem cronológica da composição original. A maior parte das epístolas foi escrita antes mesmo dos Evangelhos. Marcos foi o primeiro dos quatro evangelhos a ser escrito e João o último. Mateus ocupa o primeiro lugar em nossas Bíblias porque, como foi destinado especialmente aos judeus, faz a transição natural do Antigo para o Novo Testamento com a genealogia de Jesus.

Contudo, uma vez que as nossas Bíblias não seguem a ordem cronológica da formação do Novo Testamento, por que o Evangelho de Lucas não vem logo após o de João, ficando ao lado de Atos, que também foi escrito por Lucas? É que Mateus, Marcos e Lucas são livros “sinóticos”, isto é, tratados com um foco semelhante ou mesma visão em relação a Cristo. O Evangelho de João é mais místico, enfatiza a divindade de Jesus; os outros o fazem, mas não com a mesma intensidade de João.

As Epístolas também não seguem uma ordem cronológica. As paulinas, por exemplo, foram organizadas diferentemente da cronologia original. A primeira Epístola de Paulo foi a de Gálatas, segundo alguns, ou 1Tessalonicenses, segundo outros; finalizando com as pastorais. A sequência adotada em nossas Bíblias para as Epístolas paulinas segue a ordem decrescente; da maior para a menor em número de capítulos. Começa, então, com a Epístola aos Romanos (dezesseis capítulos) e termina com Filemon (um capítulo). Além disso, a Epístola aos Romanos serve como transição natural de Atos para as Epístolas paulinas. O livro de Atos termina com a prisão de Paulo em Roma.

A carta aos Hebreus vem logo após as Epístolas reconhecidamente de Paulo. Como não se tem certeza da autoria da Epístola aos Hebreus, e alguns a atribuem a Paulo, ela foi deixada onde a conhecemos atualmente. Há também, em nossas Bíblias, uma ordem decrescente nas Epístolas gerais, porém, em duas etapas distintas, ou seja, de Hebreus às Cartas de Pedro; das Epístolas de João a Judas.

O livro do Apocalipse, como foi o último livro da Bíblia a ser escrito, está, cronologicamente, no lugar certo. Ele foi escrito pelo apóstolo João, por volta do ano de 96 d.C.

CONCLUSÃO

Como a Estrutura atual da Bíblia ficou sujeita a diversas variações históricas, seria um exagero supor que essa estrutura foi dada por Deus. Contudo, a ordem em que ela é apresentada não é puramente arbitrária. Na verdade, a ordem evidencia que seu direcionamento é proposital, pelo menos à medida que é organizada em categorias significativas, já que apresenta o desenrolar histórico do drama da revelação redentora. Uma vez que a redenção e a revelação convergem sobre a pessoa de Jesus Cristo, pode-se observar que as várias seções das Escrituras formam uma estrutura cristocêntrica (Lc.24:27,44; João 5:39; Hb.10:7). Em outras palavras, Cristo não é somente o tema de ambos os Testamentos, mas pode ser entendido também como o tema na sequência de cada uma das oito seções das Escrituras Sagradas.

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Luciano de Paula Lourenço – EBD/IEADTC

Disponível no Blog: http://luloure.blogspot.com

Referências Bibliográficas:

Bíblia de Estudo Pentecostal.

Bíblia de estudo – Aplicação Pessoal.

Bíblia de Estudo – Palavras Chave – Hebraico e Grego. CPAD

William Macdonald. Comentário Bíblico popular (Antigo e Novo Testamento).

Comentário Bíblico Pentecostal. CPAD.

Comentário do Novo Testamento – Aplicação Pessoal. CPAD.

Norman L Geisler. Introdução geral à Bíblia. Vida Nova.

Panorama do Novo Testamento – Jean-Baptiste Sawadogo.

3 comentários:

  1. Graça e paz!
    Que Deus continue poderosamente usando cada vez mais o senhor no ministério da palavra do Nosso Deus e Senhor Jesus, para a edificação do seu povo..

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  2. Um excelente comentários sobre essa maravilhosa lição,que Deus continue lhe usando.

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  3. Muito bom! Deus continue vos abençoando grandemente, em nome de Jesus Cristo.

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