segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Aula 08 – NÃO MATARÁS


1º Trimestre/2015

Texto Base: Êxodo 20:13; Números 35:16-25

“De palavras de falsidade te afastarás e não matarás o inocente e o justo; porque não justificarei o ímpio” (Êx 23:7).

INTRODUÇÃO

Dando sequência ao estudo do Decálogo, vamos estudar nesta Lição o Sexto Mandamento. Este Mandamento é imperativo: “não matarás” (Êx 20:13; Dt 5:17). O homicídio doloso, pérfido, insulta a Deus, o doador da vida. A existência do ser humano é a Sua mais importante possessão. Por isso, o Senhor expressa Seu desejo de que ela seja honrada, respeitada e preservada.

I. O SEXTO MANDAMENTO

1. Abrangência. "Não matarás." Muitos especialistas em língua hebraica dizem que este texto seria melhor traduzido por “não assassinarás”. Isto explicaria algumas passagens difíceis do Antigo Testamento em que o próprio Deus permite ou mesmo ordena que algumas pessoas sejam mortas (Ex 17:14; 1Sm 15:1-3, etc).

Este mandamento proíbe o homicídio, o assassinato premeditado e o não premeditado. Temas como eutanásia, feticídio, suicídio, infanticídio, genocídio, são pertinentes ao sexto mandamento. Todavia, este mandamento não proíbe a pena capital, visto que a própria lei estipulava a pena de morte. Também se permitia a guerra, visto como o soldado atua como agente do estado. Há uma análise, a seguir, sobre estes temas.

2. Objetivo. O objetivo do Sexto Mandamento: a preservação da vida e a proibição do assassinato premeditado, ou seja, o homicídio doloso. O povo da Nova Aliança, que faz a Igreja do Senhor Jesus, que vive em um contexto completamente diferente daquele vivido pelos fiéis da Antiga Aliança, deve lutar pela defesa da vida.

Na Nova Aliança o Sexto Mandamento inclui “pensamentos e palavras, ira e insultos”. Segundo o Rev. John Stott, "os escribas e fariseus estavam evidentemente procurando restringir a aplicação do Sexto Mandamento apenas ao ato do homicídio, isto é, ao derramamento de sangue humano, mas Jesus discordou deles. A verdadeira aplicação da proibição era muito mais ampla: incluía pensamentos e palavras, além de atos; cólera e insultos, além do homicídio".

Há, então, um aspecto existencial, isto é, relacionado com o mundo interior da pessoa. Mata-se alguém não só literalmente, mas também no coração. O apóstolo João diz que é homicida quem odeia a seu irmão (1Jo 3:15). Se alguém tem ódio de uma pessoa, é como se a tivesse assassinado em seu coração. Jesus ensina que para Deus isto é tão errado e condenável como um assassinato.

É possível que haja crentes que frequentem regularmente a igreja e participam de suas atividades, mas tenham ódio de outras pessoas, quem sabe até mesmo dentro da própria igreja. Crentes que se reúnem em torno da mesa do Senhor, participam da Santa Ceia, mas com o coração carregado de ódio. Estas atitudes devem ser abandonadas pelos que pretendem ser fiéis a Jesus. A Bíblia recomenda a todos que tenham um esforço especial para viver em paz com todos os homens (Rm 12:18).

Também, a defesa da vida, que é o objetivo do Sexto Mandamento, abrange o aspecto social. Um dos deveres exigidos é confortar e socorrer os aflitos e proteger e defender os inocentes (Mt 25:35,36; Pv 31:8,9; Is 58:7). Isto é dever do Estado, mas, também da Igreja. Todo esforço cristão nesta área é válido, pois levará os não cristãos a glorificar ao Pai que está nos céus (Mt 5:16).

3. Contexto. “Não matarás”, já era um mandamento gravado na consciência de toda a humanidade, desde o primeiro ser humano, e estará gravado na consciência do último ser humano que restar na terra. Todo homem normal, sempre foi e será capaz de discernir entre o certo e o errado, entre o ético e o antiético, entre o bem e o mal. Milhares de anos antes da Lei Moral ter sido escrita para Israel, lá no Sinai, não foi preciso Deus falar para Adão que ele tinha pecado, que ele havia cometido um ato antiético para com o seu Criador. Dentro de Adão, a sua própria consciência o acusava. Então, ouvindo a voz de Deus, escondeu-se – “E chamou Deus a Adão, e disse-lhe: onde estás? E ele disse: ouvi a tua voz soar no jardim e temi, porque estava nu, e escondi-me” (Gn 3:9-10).

Aconteceu, também, com Caim quando matou Abel. Em nenhum lugar estava escrito “não matarás”, todavia, Deus não o teve por inocente, porque a Lei Moral estava gravada em sua consciência e, por ela, o homem sabia da necessidade de valorizar a sua vida, ou do próximo. Tirar a vida de alguém é um direito tão somente do doador da vida. Assim, Deus não teve Caim por inocente – E disse Deus: que fizeste? A voz do sangue do teu irmão clama a mim desde a terra, que abriu a sua boca para receber o sangue do teu irmão “(Gn 4:10).

Portanto, a Lei Moral não estava escrita, no papel, porém, já estava gravada na consciência do primeiro ser humano e na consciência dos seus descendentes (Rm 1:19; 2:14,15).

II. IMPORTÂNCIA

1. Da vida. Biblicamente a vida pertence a Deus (Dt 30:15; Sl 36:9; Lc 12:20). Deus criou, santificou e abençoou a vida humana. Ele é, pois, o Criador, o doador e o Senhor da vida. Só Ele pode tirá-la. Ao homem Ele ordenou: “Não Matarás”. Portanto, tirar a vida própria ou alheia é ofender a Deus e depreciar o Criador.

O valor da vida não depende dos anos acumulados, nem da capacidade física ou intelectual da pessoa. Antes, a vida é um bem pessoal intransferível e incalculável. Por isso, nenhum indivíduo, nenhuma organização ou sociedade, nenhum grupo de médicos e nem o próprio Estado secular podem arrogar a si o direito de legalizar a matança de seres indefesos ou classificar as pessoas, separando as que devem morrer das que podem viver.

A vida do homem é um bem inalienável. A vida pertence a Deus. Está escrito: “Do Senhor é a terra e a sua plenitude; o mundo e aqueles que nele habitam” (Sl 24:1); “...pois ele mesmo é quem dá a todos a vida, e a respiração, e todas as coisas” (Atos 17:25). Desta feita, ninguém pode dizer que a “vida é minha, eu faço dela o que quero”.

2. Não matar. O que significa não matar? O Sexto Mandamento é aplicável em situações de guerra? Qual a resposta bíblica diante da crescente criminalidade? O homem tem direito de morrer com dignidade e sem dores? Até quando é justo prolongar a vida por meios artificiais?

O termo hebraico, de onde se origina a palavra “matar”, expressa pela primeira vez em Êx 20:13, dá a ideia de assassinar, matar com violência, de maneira injusta e cruel. Assassinar alguém é o pior crime que uma pessoa pode cometer, e isso é um golpe contra o próprio Deus, visto que o ser humano foi feito à sua imagem (Gn 1:26,27).

O "Não matarás" é a proteção da vida. Observe que este mandamento é ratificado no Novo Testamento pelo Senhor Jesus Cristo e seus apóstolos (Mt 19:18,19; Rm 13:9; Tg 2:11; 1Jo 3:15).

A valorização e proteção da vida como bem pessoal proíbe de forma categórica qualquer forma de assassinato. O “não matarás” inclui de maneira direta a proibição dos seguintes crimes: a eutanásia, o feticídio, o suicídio, o infanticídio e o genocídio. Para uma melhor compreensão vamos tecer algumas considerações gerais e individualizadas para estas situações.

a) Eutanásia e feticídio(aborto). Num primeiro momento pode parecer tratar-se de dois assuntos totalmente diferentes, porém ao se identificar cada um deles vê-se que são dois extremos de um elo comum, ou seja, dois acontecimentos que podem ocorrer um no início e outro no final de uma vida. Os dois possuem um só objetivo, a saber, a supressão ou interrupção de uma vida.

Pelo Aborto, procura-se impedir que um ser humano venha ao mundo, enquanto que pela Eutanásia, tirá-la deste mundo, sem que, pelo processo normal, se tenha chegado o tempo de Deus nos termos descritos por Salomão:” Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu. Há tempo de nascer e tempo de morrer...” (Ec 3:1-2). Contudo, o Pós-Modernismo ignora o que diz a Palavra de Deus, defendendo, em todo o mundo, a legalização da intervenção do homem, quer para selecionar quem pode nascer, quer para determinar quem deve morrer. Em muitos países esses dois tipos de assassinatos estão legalizados, contrariando o Sexto Mandamento.

A Eutanásia é conhecida como homicídio piedoso. A Bíblia, porém, não faz diferença entre homicídio piedoso e homicídio maldoso. O que ela diz é “não matarás”. Quanto ao homicida, a Bíblia diz: “...Mas, quanto...aos homicidas...a sua parte será no lago que arde com fogo e enxofre; o que é a segunda morte” (Ap 21:8). Esta é a verdade bíblica!

b) O suicídio. O suicídio nada mais é que um autoassassinato. A Palavra de Deus não distingue entre matar a si próprio ou ao semelhante. Diz apenas o mandamento que não se deve matar, entendido aqui um ser humano, seja ele quem for, inclusive o próprio matador. A Palavra de Deus diz que os homicidas não se salvarão (Ap 21:8; 22:15).

No suicídio, o homem, além de se fazer juiz sobre a sua própria vida, o que lhe é vedado, pois já vimos que só Deus é o dono da vida – “O SENHOR é o que tira a vida e a dá; faz descer à sepultura e faz tornar a subir dela” (1Sm 2:6) -, além do mais demonstra total falta de confiança e de esperança em Deus, porquanto busca resolver seus problemas e dificuldades pondo fim à sua vida, demonstrando, com isso, que não confia em Deus. O verdadeiro cristão, pelo contrário, ainda que esteja a passar problemas e dificuldades, não vai buscar a solução no suicídio, mas em Deus. A Palavra de Deus está repleta de promessas de que o Senhor sempre estará ao nosso lado, se nos mantivermos fiéis (Is 43:1-5; Sl 91:1; Mt 28:20).

Sempre se terá no suicídio um gesto de falta de fé em Deus, uma verdadeira manifestação de orgulho e de autossuficiência do suicida. Fazendo-se semelhante a Deus, o suicida recusa ser ajudado e orientado pelo Senhor e resolve pôr fim à sua vida, dando a si uma solução que, entretanto, somente lhe criará um problema eterno – a morte eterna, a eterna separação de Deus. Com efeito, o suicida morre no seu pecado e, portanto, estará irremediavelmente perdido (Ez 18:24), a menos que tenha tempo para se arrepender, o que é difícil de acontecer.

c) Infanticídio. O infanticídio é a matança consciente e deliberada de crianças. O termo técnico não tem nada a ver com o estado da criança - se está consciente, doente, é recém-nascida, deformada ou foi judicialmente declarada morta. A Bíblia cita exemplos trágicos de infanticídio sacrificial ao deus Moloque. Moloque era venerado no vale de Cedron, e crianças eram "passadas pelo fogo" (2Rs 16.3; 17.7, 31: 21.6; 2Cr 33.6; Ez 16.21; 20.26,31). O rei Acaz (2Cr 28.3), por volta de 730 a.C, e o rei Manasses (2Rs 21.6) sacrificaram seus próprios filhos. A lei mosaica proibia essa prática severamente e prescrevia até a pena capital a quem oferecesse seu filho a Moloque (Lv 18.21; 20.2-5).

O infanticídio continua sendo praticado na modernidade com toda fúria diabólica. No Brasil, de vez em quando, vê-se nos jornais sobre crianças sacrificadas em práticas de magias negras. Embora a opinião pública e a lei condenem tais práticas, até hoje não foi possível eliminá-las totalmente.

Segundo Hans Ulrich Reifler, nos Estados Unidos, o infanticídio é praticado principalmente com crianças que sobrevivem ao aborto. Aliás, o aborto é apenas a ponta de um "iceberg", cuja profundidade ninguém pode prever. Já se tornou evidente na história humana recente que assassinato de bebês antes de seu nascimento leva ao assassinato de criancinhas depois de nascidas. Infelizmente, isto é uma realidade em nossos dias. Um dos métodos aprovados de aborto é a histerectomia, em que o embrião é abortado com vida e morto depois de nascido por afogamento, fome ou corte do fluxo de oxigênio.

Isso é uma clara transgressão do Sexto Mandamento. Certamente, aqueles que praticam tão brutal assassinato não ficarão impunes. Pagarão aqui na Terra ou no inferno, num sofrimento eterno (Ap 21:8).

d) Genocídio. Segundo Hans Ulrich Reifler, genocídio é a matança consciente e deliberada de uma raça ou um povo considerado "inimigo" pelo resto da sociedade majoritária. O genocídio sempre é o resultado trágico de racismo político, fanatismo religioso, discriminação social ou preconceito econômico, moral ou até biológico.

Moisés foi salvo do genocídio decretado por Faraó contra Israel (Ex 1.22; 2.1-6). A rainha Ester salvou seu povo do genocídio planejado por Artaxerxes (Et 1-10). O terceiro exemplo de genocídio relatado na Bíblia é o massacre dos meninos com menos de dois anos ordenado por Herodes (Mt 2:16-18).

Durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), mais de 6 milhões de judeus foram massacrados em câmaras de gás e campos de concentração como resultado da campanha antissemita de Hitler. Outros inúmeros genocídios recentes foram notícias. Uma clara afronta ao Sexto Mandamento.

e) Pena de Morte. Este é um dos temas mais controvertidos da atualidade. Segundo o pr. Esequias Soares, a pena capital não viola o sexto mandamento porque não se trata de assassinato malicioso e violento de um inimigo pessoal. É uma exigência da justiça para manter o bem-estar e a segurança do povo e preservar a sociedade. Seu objetivo não era restaurar a vida do assassinado ou reparar o prejuízo, pois somente Deus pode dar a vida; era conter o crime. Deus delegou aos governantes a autoridade de dirigir legitimamente o Estado. A execução de uma pena capital é determinada pelo Estado, depois de julgamentos e de todo processo legal, tendo o réu amplos direitos de defesa. A lei de Moisés exige pelo menos duas testemunhas, sem as quais o processo não terá validade legal (Nm 35.30; Dt 17.6).

Segundo Hans Ulrich Reifler, na lei de Moisés percebemos uma radicalização da pena de morte. O princípio básico era "vida por vida, olho por olho, dente por dente" (Êx 21:23,24). A pena máxima foi permitida e sancionada por Deus nos seguintes casos: assassinato premeditado (Êx 21:12-14); sequestro (Êx 21:16; Dt 24:7); adultério (Lv 20:10-21, Dt 22:22); homossexualismo (Lv 20:13); incesto (Lv 20:11,12,14); desobediência aos pais (Dt 17:12; 21:18-21); ferir ou amaldiçoar os pais (Êx 21:15; Lv 20:9); falsas profecias (Dt 13:1-10); blasfêmia (Lv 24:11-14); profanação do sábado (Êx 35:2; Nm 15:32-36); sacrifícios aos falsos deuses (Êx 22:20).

O Novo Testamento reconhece a pena de morte, mas não se trata de um mandamento cristão. Hans Ulrich Reifler cita os seguintes argumentos a favor da pena de morte no Novo Testamento, apesar de ferir o espírito de perdão, amor e misericórdia, que formam a essência do cristianismo:

Ø  O ensino de Jesus. Temos a tendência de esquecer que Jesus reafirmou o princípio da pena máxima no sermão do monte: "Não penseis que vim revogar a lei ou os profetas; não vim para revogar, vim para cumprir... Ouvistes que foi dito aos antigos: Não matarás; e: quem matar estará sujeito a julgamento [à pena de morte]. Eu, porém, vos digo que todo aquele que (sem motivo) se irar contra seu irmão estará sujeito a julgamento" (Mt 5:17, 21,22).

Ø  Ananias e Safira. Esse casal foi condenado à morte pelas palavras apostólicas de Pedro. Eles tiveram morte imediata porque mentiram (At 5:13). Encontramos, então, claras evidências de que o Novo Testamento, mesmo na dispensação da graça, permite que homens condenem homens à morte.

Ø  O ensino de Paulo. Em Romanos 13:1,2 vemos que Deus deu a espada às autoridades humanas para protegerem a vida. O uso da espada para o bem da sociedade logicamente inclui a pena de morte em casos especiais. Mas é importante observar que a espada foi dada para o bem da sociedade e não deve ser empregada indiscriminadamente.

Ø  A morte de Jesus Cristo. Pilatos realmente teve autoridade para prescrever a pena máxima a Jesus, e Cristo Se submeteu a ela (João 19:11). Sem essa pena não gozaríamos de tão grande salvação.

Diante de todos esses argumentos, concluímos que realmente existem exemplos morais concludentes no Antigo e no Novo Testamentos, que mostram que Deus ordenou, e os homens exerciam a pena capital para delitos específicos.  

“Todos reconhecem que a pena de morte é uma lei que fere o espírito de perdão, amor e misericórdia, que formam a essência do cristianismo; no entanto, ela está presente no Novo Testamento. A diferença do Antigo Testamento é que ali a lei prescreve como parte de um sistema legal, e aqui não é mandamento, conselho ou incentivo. O Novo Testamento apenas reconhece que a pena capital existe” (Esequias Soares).

Sou partidário dos que preferem apoiar penas alternativas, como o caso da prisão perpétua, onde o criminoso tem a oportunidade de se recuperar, e até de se tornar um crente salvo em Cristo Jesus.

f) Guerras e defesa pessoal. Segundo Hans Ulrich Reifler, a questão da guerra é o segundo exemplo clássico que não se enquadra necessariamente no sexto mandamento. O povo de Israel jamais considerou que este mandamento proibisse guerras, mesmo porque o próprio Deus ordenou várias guerras: contra Amaleque (Êx 17.8-16; 1Sm 15.1-9), contra os filisteus (1Sm 7.1-14), contra os amonitas (1Sm 11:1-11), contra Jericó (Js 6.2ss.), contra a cidade de Ai (Js 8:1ss.), contra os cananeus (Js 11.19,20) e muitas outras, mencionadas principalmente nos livros históricos do Antigo Testamento.

O próprio Deus é conhecido como "homem de guerra" (Êx 15.3; Is 42.13). O título "Senhor dos Exércitos" (Êx 12.41; 1Sm 17.5; Sl 46) indica que Deus luta contra os inimigos ao lado de Seu povo. Em Números 21:14 lemos: "livro das Guerras do Senhor". O próprio Deus, na qualidade de capitão, chefiava o exército (2Cr 13.12). Na oração do rei Salomão, temos uma forte indicação de que o Senhor envia Seu povo contra os inimigos (2Cr 6.34). Ele armou emboscadas (2Cr 20.22) e ensinou o salmista a combater (Sl 144.1). Algumas vezes, Deus assumiu a batalha e combateu sozinho, enquanto o exército de Israel ficava quieto (2Cr 20.17). Qualquer guerra "convocada por Deus" estava fadada a ser vencida pelos israelitas.

Assim, qual a posição dos cristãos com respeito à guerra? Até que ponto o cristão pode envolver-se em conflitos bélicos? Existem normas ou diretrizes bíblicas para nos orientar nesta questão?

Quanto a esse problema, o cristianismo divide-se em pelo menos três correntes de pensamento, segundo Hans Ulrich.

- Primeira corrente: o ativismo. O ativismo sustenta que o cristão deve ir para todas as guerras em submissão e obediência ao governo instituído e ordenado por Deus (Rm 13.1-7). Para justificar sua posição, essa linha de pensamento opera com as seguintes referências bíblicas: Gênesis 1.28; 9.5,6; Êxodo 21.23-25; Mateus 22:21; Romanos 13.1-7; 1Timóteo 2.2; Tito 3.1; 1Pedro 2.13,14.

Como podemos justificar guerras entre nações pagãs de hoje baseados em guerras ordenadas pelo Senhor no Antigo Testamento? Nenhuma dessas nações é o povo escolhido por Deus. Diz mais Hans: o problema é a tendência de idolatrar o Estado, considerando-o infalível ou, até, idêntico à vontade de Deus. E isso, evidentemente, está muito longe da realidade.

- Segunda corrente: o pacifismo. O pacifismo argumenta que o homem nunca deve participar de guerras; ele deve poupar a vida dos outros, visto que Deus ensina que é proibido matar. Os principais argumentos do pacifismo podem ser resumidos assim: matar é sempre errado; também é errado usar a força para resistir ao mal, porque a vingança pertence a Deus (Mt 5.39; Dt 32.35); a guerra é baseada no mal da ganância; a guerra sempre resulta em muitos males; a violência gera mais violência e a guerra cria mais guerras. O pacifismo moderado (ou pacifismo cristão) opõe-se ao serviço militar armado.

- Terceira corrente: o seletivismo. O seletivismo afirma que é necessário fazer uma diferença entre guerras justas e guerras injustas, e que se deve participar de algumas delas, visto que agir de outra forma seria recusar-se a fazer o bem maior ordenado por Deus.

Os argumentos do seletivismo são:

ü  Deus sancionou a pena máxima após o dilúvio (Gn 9.6);

ü  Está de acordo com a lei de Moisés (Êx 21-26), reafirmada por Pedro (1Pe 2.13);

ü  Paulo ensina que toda autoridade procede de Deus (Rm 13.1-7);

ü  Jesus Cristo se submeteu à pena capital (Jo 19.11);

ü  Está implícito no fato de o apóstolo Paulo buscar a proteção do exército romano (At 22.25-29; 23.23): e

ü  É estimulado em Tiago 4.17: "... aquele que sabe que deve fazer o bem e não o faz, nisso está pecando".

Finaliza Ulrich: o seletivisia não cai num ativismo cego nem foge à responsabilidade cívica nos momentos cruciais de seu país. Ele avalia a situação, ora e depois se posiciona como ser livre e responsável.

Concordo com o Ev. Dr. Caramuru Afonso Francisco, quando diz que um papel que Deus requer do cristão é a de ser pacificador. Muito mais do que ativistas do pacifismo que estão surgindo nos últimos tempos pelo mundo. Pacifista é alguém que é a favor da paz e que, para que esta paz venha, muitas vezes, recorre a métodos tão condenáveis quanto a política de guerras das autoridades, como se verifica, comumente, nas chamadas "manifestações antiglobalização" em que depredações, invasões, agressões são corriqueiras e nada têm a ver com a paz. Recorrem à violência para pregar a paz. Já os pacificadores, muito pelo contrário, são contundentes, firmes em suas atitudes e convicções, mas não recorrem jamais à violência. Jesus disse no sermão do monte: "Bem-aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus"(Mt 5:9).

Mas, para sermos pacificadores de uma nação que está envolta na violência e na criminalidade, como o Brasil, é preciso, antes, sermos pacificadores no nosso lar, na nossa sala de aula, no nosso local de serviço, na nossa igreja local. Temos sido pacificadores, ou somos criadores de contenda entre os irmãos? Lembremo-nos de que o que cria contendas entre irmãos é abominado pelo Senhor! (Pv 6:16-19).

Só o cristão pode levar aos homens a verdadeira paz, que lhes foi deixada por Cristo (João 14:27), pois a paz não é a simples ausência de conflitos humanos, ausência esta que é assaz enganadora (1Ts.5:3), mas a comunhão com Deus, a única fonte de paz.

III. PROCEDIMENTO JURÍDICO

A Bíblia salienta e sustenta a inviolabilidade da vida humana. Deus proibiu de forma cabal o assassinato do ser humano, desde o limiar da raça humana. Está escrito: “Quem derramar o sangue do homem, pelo homem o seu sangue será derramado; porque Deus fez o homem conforme a sua imagem” (Gn 9:6).

A lei de Moisés traz instruções específicas sobre o procedimento jurídico do homicídio doloso, quando há intenção de matar, e do homicídio culposo, quando não há intenção de matar. O capítulo 35 de Números aborda exclusivamente esse tema.

1. Homicídio doloso (Nm 35:16-21). Aqui, são dadas as instruções especificas aceca do procedimento jurídico sobre o homicídio doloso. Se alguém ferir de morte seu próximo, de forma intencional, premeditada e deliberada, e a pessoa golpeada morrer, o autor da ação é considerada homicida. Neste caso, de homicídio doloso; nem mesmo o altar de Deus serviria de refúgio para este tipo de assassino (vide o caso de Joabe – 1Rs 2:28-33).

2. Homicídio culposo (Nm 35:22-25). Se o indivíduo não armou cilada (Êx 21:13) para a vítima, então o assassino poderia fugir e se refugiar no altar de Deus; mais tarde, seriam criadas cidades de refúgio com esse propósito (Nm 35:22-28), e ali o assassino estaria seguro até que a questão fosse julgada e a verdade determinada por tribunal apropriado. Essas cidades apontavam para o refúgio que só Jesus oferece. Através do seu sangue, Ele nos mostra um lugar seguro, onde todos os que quiserem estarão protegidos para sempre do pecado e da morte. “Deus é o nosso refúgio e fortaleza, socorro bem presente na angústia” (Salmo 46:1).  

Vejamos, em resumo, alguns aspectos significativos sobre as cidades de refúgio:

a) O que as cidades de refúgio representavam? As cidades de refúgio representavam, em linguagem jurídica de hoje, um "habeas corpus" a favor do homicida involuntário (crime culposo), ou cujo crime não tivesse sido apurado adequadamente. Em caso de homicídio, pela lei, caberia ao parente mais próximo do falecido a responsabilidade de aplicar a "Lei de Talião" ao homicida, e isto poderia ser feito a qualquer hora e em qualquer lugar, exceto na cidade de refúgio, onde o homicida que não matara intencionalmente poderia aguardar seu julgamento em segurança (Nm 35:11,12). O refugiado não poderia sair da cidade. Se o fizesse, correria por sua conta o que acontecesse, pois o vingador o apanharia, e não haveria apelo para ele. As cidades de refúgio eram bem fortificadas e muradas, com portas nas extremidades, que podiam ser fechadas para impedir a chegada do vingador.

b) A cidade de refúgio é um tipo perfeito de Cristo. A cidade de refúgio protegia tanto aos filhos de Israel quanto ao estrangeiro (Nm 35:15), pois se levava em consideração o princípio da inocência e não da nacionalidade, e representava para o homicida perseguido e fugitivo, segurança e descanso ao mesmo tempo, tornando-se assim um tipo perfeito de Jesus Cristo, que recebe todos quantos tiverem acesso a Ele (João 6:37). Somente estando em Jesus Cristo, o refúgio eterno, o pecador estará para sempre livre da sentença mortífera do pecado (João 5:24).

Ao determinar a construção das seis cidades de refugio, Deus Pai não estava querendo com isso proteger o assassino, mas dar um lugar de refugio àquele que cometia homicídio involuntário. Jesus é muito mais que aquelas cidades: é o refúgio para os culpados.

 

CONCLUSÃO

 

O Sexto Mandamento foi dado por Deus para proteger a vida. Por mais que sejamos tentados a defender o "olho por olho e dente por dente", diante de uma tremenda injustiça, precisamos fazer o exercício diário de olharmos para Jesus e nos lembrarmos de que, mesmo a sua vida esvaindo-se, o nosso Senhor exalava o perdão contra os seus algozes.

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Luciano de Paula Lourenço - Disponível no Blog: http://luloure.blogspot.com

Referências Bibliográficas:

Bíblia de Estudo Pentecostal.

Bíblia de estudo – Aplicação Pessoal.

Revista Ensinador Cristão – nº 61. CPAD.

Paul Hoff – O Pentateuco. Ed. Vida.

Leo G. Cox - O Livro de Êxodo - Comentário Bíblico Beacon. CPAD.

Victor P. Hamilton - Manual do Pentateuco. CPAD.

Esequias Soares. Os Dez Mandamentos – Valores Divinos para uma Sociedade em Constante Mudança. CPAD.

Hans Ulrich Reifler. A ética dos dez Mandamentos. Vida Nova.

Comentário Bíblico popular (Novo Testamento) - William Macdonald.

GEISLER, Norman L. Ética Cristã: alternativas e questões contemporâneas. São Paulo: Vida Nova, 1984.

Caramuru Afonso Francisco – O cristão e a guerra. PortalEBD.

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