2º Trimestre/2016
Texto Base: Romanos
7:1-15
“Dou graças a Deus
por Jesus Cristo, nosso Senhor. Assim que eu mesmo, com o entendimento, sirvo à
lei de Deus, mas, com a carne, à lei do pecado” (Rm 7:25).
Objetivo desta Aula: “Mostrar que a luta entre carne e espírito é uma
realidade na vida de todo crente” (LBP).
Nesta Aula,
estudaremos o capítulo 7 da Epístola aos Romanos. Este capítulo é um dos mais
complexos e difíceis desta Epístola, talvez um dos mais densos de todo o Novo
Testamento. Há uma gama enorme de opiniões dos estudiosos acerca da sua real
interpretação. Este capítulo trata a respeito da libertação da Lei. Ora, se já
fomos libertados da Lei, e estamos debaixo da graça de Deus, por que muitos dos
que cristãos dizem ser passam por conflitos espirituais internos? Na realidade,
qual é o lugar da Lei na vida do cristão? Ela é a causa do pecado? É a causa da
morte? Eu diria que a Lei não é a causadora da morte, mas sim o pecado; assim
como o problema de um criminoso não é a lei, mas sua transgressão.
John Stott menciona
três grupos que lidam com a Lei de formas diferentes: Em primeiro lugar, os legalistas. Eles procuravam observar
os preceitos da Lei com o propósito de ser salvos (Lv 18:5). Uma vez que não
conseguiam cumprir as exigências da Lei, os legalistas acabavam ostentando uma
religiosidade apenas de aparência. Viviam debaixo de um jugo pesado e queriam
colocar essa mesma canga sobre os demais. O legalista torna-se um fariseu,
cujas ações exteriores são aceitáveis, mas cujas atitudes interiores são
desprezíveis. Em segundo lugar, os
libertinos. De forma diametralmente oposta, estes olhavam para a lei como a
causadora de todos os seus problemas. Queriam sacudir o seu jugo para viver sem
freios e sem limites. Assim, a graça de Deus é transformada em libertinagem.
Esse ainda é o modo de agir da chamada "nova moralidade". Seus
seguidores sacudiram de sobre si o jugo divino e anularam a lei moral de Deus.
Contudo, certamente esse não é o significado que Paulo quis dar quando disse
que não estamos mais debaixo da lei e sim da graça (Rm 6:14). É importante
destacar que, quanto à justificação, não estamos mais debaixo da lei, e sim da
graça; e, para sermos santificados, não dependemos da lei, mas somos guiados
pelo Espírito Santo. Em terceiro lugar,
os cristãos. Estes se regozijam tanto em sua libertação da Lei como em
sua liberdade para cumpri-la. Deleitam-se na Lei por ser a revelação da vontade
de Deus (Rm 7:22), mas reconhecem que a força para cumpri-la não provém da Lei,
mas do Espírito de Deus. Em síntese, o legalista teme a Lei e está debaixo de
sua servidão; o libertino detesta a Lei e a lança fora; o cristão respeita a
Lei, à qual ama e obedece.
I. A LEI ILUSTRADA
NA ANALOGIA DO CASAMENTO (Rm 7:1-6)
Na Aula anterior,
aprendemos que quando Cristo morreu nós também “morremos” para o pecado.
Adquirimos uma nova natureza: a natureza espiritual. Porém, enquanto estivermos
vivos em nosso corpo corruptível, temos que lidar com nossa natureza carnal e
suas tentativas de controlar nossos pensamentos e ações. Para descrever essa
tensão entre a nossa antiga natureza e a nova, Paulo usou a analogia do
casamento para explicar a situação de escravidão ao pecado e de servir a Deus.
A lei é como um marido perfeccionista; esse marido condena a esposa por sua
menor falha. Somente a morte pode interromper esse casamento. Assim como a
morte cancela os votos matrimoniais, morrer em Cristo na sua morte interrompe o
nosso “casamento” com o pecado.
1. A metáfora do casamento (Rm 7:1-3). “Não sabeis vós,
irmãos (pois que falo aos que sabem a lei), que a lei tem domínio sobre o homem
por todo o tempo que vive? Porque a mulher que está sujeita ao marido, enquanto
ele viver, está-lhe ligada pela lei; mas, morto o marido, está livre da lei do
marido. De sorte que, vivendo o marido, será chamada adúltera se for doutro
marido; mas, morto o marido, livre está da lei e assim não será adúltera se for
doutro marido”.
Em Rm 7:1, Paulo
mostra que a lei tem domínio sobre o homem durante toda a sua vida. Apenas a
morte pode interromper o domínio da lei sobre nós. Se a morte sobrevém, os
relacionamentos estabelecidos e protegidos pela lei são dados por terminados.
Não se espera que um cadáver siga quaisquer leis, e ele não pode pagar pelos
pecados cometidos.
Os cristãos
destinatários da Epístola (principalmente aqueles familiarizados com os
princípios da lei) deveriam saber que não estavam mais debaixo da lei e sim da
graça (Rm 6:14), e que ela não se aplica àquele que está morto em Cristo na Sua
morte. Para ilustrar esse fato, Paulo faz uma ilustração da lei na analogia do
casamento. Mostra que somente a morte rompe o contrato de casamento.
Paulo compara a lei
com um marido e os crentes com uma esposa. Esse casamento é turbulento e conflituoso.
A culpa não é do marido (a lei); ele é perfeito, santo, justo e bom. O problema
é que essa esposa (os crentes) nunca consegue agradá-lo, pois é imperfeita,
carnal, rendida ao pecado e sempre frustra as expectativas do marido. O
contrato de casamento perde sua validade quando um dos cônjuges morre.
Entendendo
melhor a metáfora...
Imagine o seguinte casamento: o marido é um
perfeccionista; para ele tudo tem que estar no devido lugar, no lugar certo; a
mulher tem que fazer a comida numa determinada temperatura; os talheres têm que
estar arrumados em determinada forma na mesa; ele quer sua camisa perfeitamente
engomada, com colarinho passado em uma determinada forma, tem que estar dobrado
exatamente do jeito que ele quer no guarda-roupa; os móveis têm que estar todos
limpinhos sem nenhuma poeira na sala; a posição dos móveis tem que estar numa
determinação peculiar. Esse homem tem horário cronometrado: diariamente, ele
acorda regularmente às 6:50h; 15 minutos depois ele está à mesa devidamente vestido
para tomar o café; 10 minutos depois ele está saindo de casa; chega em casa
exatamente às 18:00hs e a comida tem que estar pronta; assiste ao jornal predileto
e vai para cama exatamente às 22:00h. Ele faz isso todo dia! Tudo tem que ser e
estar exatamente do jeito dele!
Quanto
à mulher desse marido: ela é uma folgada; é desastrada,
coitada! Ela ama o marido, ela quer agradar o marido, mas ela é esquecida: não
se lembra dos horários; esquece como o marido quer as coisas; queima a comida;
mancha a camisa dele... E ele não ajuda. Ele fica dizendo: você não presta para
nada; não sei por que casei com você; nada que você faz dá certo; nada, você
não presta para nada! E aquela mulher vive num estado de desespero porque não
consegue agradar o marido. E aí ela começa a pensar em outro homem, que é tão
exigente quanto ao marido, tão certinho quanto o marido, mas compreende, ajuda,
dá uma força, entende, apresenta seu suporte... Ela começa a pensar como ela
pode se casar com outro homem. Humanamente falando, a solução para isso seria
matar o marido. Só que ele não morre! Ele malha na academia e ele tem hábitos
alimentares perfeitos. Desse jeito, o cara vai viver mais de 100 anos! E isto é
um desespero para essa mulher! Como, então, encontrar uma solução?
2. A metáfora da mulher viúva. Dando continuidade a analogia do casamento, Paulo
afirma que se uma mulher se unir com outro homem, enquanto o marido estiver
vivo, cometerá adultério. Porém, se a mulher é viúva, ela estará livre para se
casar novamente, sem ser culpada de qualquer delito. Somente a morte divorcia
um matrimônio. Isto é, a única possibilidade de a mulher ficar livre do marido
para unir-se a outro marido é a morte dele. A ideia central é que essa morte
não apenas encerra um relacionamento, mas abre caminho legal para que a mulher
inicie outra união. Isso porque, ainda que o casamento seja para toda a vida,
não se estende para além da vida. Paulo, portanto, queria que os cristãos
destinatários de sua Epístola se lembrassem de que, sob circunstâncias normais,
qualquer quebra dos votos matrimoniais seria considerada adultério, “porque a mulher que está sujeita ao marido,
enquanto ele viver, está-lhe ligada pela lei” (Rm 7:2).
Entendendo melhor a metáfora...
A Mulher
somos nós e o Marido é a lei. É este casamento que não
dá certo! A Lei exige, pede e é toda certinha, mas o problema é que nós, como
aquela Mulher, não conseguimos obedecer às demandas da Lei. E não temos como
fazer porque estamos ligados à Lei a vida toda. A mulher casada está ligada
pela lei ao marido enquanto ele vive. Porém, se o Marido morrer ela estar
desobrigada da lei conjugal, e assim ela pode se casar novamente. É o que
Romanos 7:3 diz: “De sorte que será
considerada adúltera se, vivendo ainda o marido, unir-se com outro homem;
porém, se morrer o marido, estará livre da lei e não será adúltera se contrair
novas núpcias”.
Esta
era a nossa situação: estávamos casados com a Lei. E nós não
conseguíamos agradar a Lei. Não conseguíamos fazer o que a Lei mandava. E aí começamos
a pensar no outro. Quem é o outro? Jesus. Ele é tão exigente quanto à Lei, ou
até mais; só que sabemos que Ele nos ama, e que aquilo que nos pede Ele nos dá força
e graça para fazer. Mas eu não posso pertencer a Jesus porque eu estou casado
com a Lei de Deus desde que nasci. Então o que eu faço para sair deste
casamento? Veja a solução no item seguinte.
3. Mortos para a lei (Rm 7:4). Sabe qual foi a solução de Deus para este
impasse? Não foi matar o Marido (a lei). Foi matar a Esposa (nós). Perceba isto
em Romanos 7:4. Até agora só se falava: “se o marido morrer”, “se morrer o
marido”. Todavia, quem realmente morre é a Mulher (nós). É o que Paulo narra: ”Assim, meus irmãos, também vós morrestes relativamente à lei, por
meio do corpo de Cristo, para pertencerdes a outro, a saber, aquele que ressuscitou dentre os mortos, a fim de
que frutifiquemos para Deus”.
Com a morte da Mulher (os crentes) o
problema foi solucionado; o vínculo conjugal com o primeiro Marido acabou. Ela
está morta em relação a esse Marido. Uma vez que ela ressuscitou (Cl 3:1), está
livre para pertencer a outro Marido, espiritualmente falando! Foi este o
caminho de Deus! O caminho de Deus não foi tirar a Lei, mas nos tirar debaixo
dela. E como isso aconteceu? Da mesma forma que nos tirou do pecado. Como é que
nós morremos para o pecado? Pela nossa união com Cristo. E como nós somos
livres do casamento com a Lei para podermos pertencer a Cristo? Romanos 7:4
explica: “Assim, meus irmãos, também vós
morrestes relativamente à lei, por meio
do corpo de Cristo...”.
Quando Cristo morreu na cruz, nós não
somente morremos para o pecado, mas nós também morremos para aquilo que dar
força ao pecado, que é a Lei. Agora mortos para o pecado, com quem estávamos
casados desde o nascimento, nós podemos pertencer ao outro sem cometer
adultério. Quem é este outro? Está no final do versículo 4: “...aquele
que ressuscitou dentre os mortos,
a fim de que frutifiquemos para Deus”.
Agora posso frutificar para Deus. Enquanto
eu estava debaixo da Lei não tinha como frutificar para Deus, porque frutificar
para Deus seria dar o bom fruto, obedecer à Lei, fazer a vontade de Deus, mas
eu não podia, eu não conseguia! Mas agora eu saí de debaixo da Lei e estou
unido a Cristo, que ressuscitou dentre os mortos e pela força dele, pela força
da Sua ressurreição, agora dou fruto para Deus.
Cada crente pertence
inteiramente a Cristo; isto acontece por causa da morte de Cristo na cruz, e
pelo fato do crente estar unido a Ele em sua morte e ressurreição. Somente
pertencendo a Cristo é que podemos produzir bons frutos, isto é, realizar boas
obras e viver uma vida que agrada a Deus.
Enquanto a Lei nos
governava, não haveria a menor possibilidade de sermos libertados da escravidão
do pecado. A única alternativa seria a nossa desobrigação da Lei. Isso já
ocorre com a nossa união com Cristo, em sua morte, pois toda a virtude da morte
de Cristo, ao satisfazer as reivindicações da Lei, nos tornou livres da
escravidão e do poder do pecado a que estávamos consignados pela Lei.
Portanto, assim como
a morte rompe o relacionamento conjugal, também a morte do cristão com Cristo
(neste caso, a morte da antiga personalidade) rompe o poder da Lei sobre ele. O
antigo arranjo contratual tinha que ser completamente rompido antes que o novo
se iniciasse. Isto tinha que ser tão definitivo quanto a morte. Os crentes
judeus não podiam viver uma dupla devoção. Eles não podiam viver sob o domínio
de Cristo e sob o domínio da Lei. O tal compromisso com Deus não pode coexistir
com o compromisso total com a Lei; isto seria adultério espiritual.
Convém observar que
Paulo não diz que a Lei está morta. Somos nós que morremos relativamente à lei,
por meio do corpo de Cristo, uma referência à entrega do seu corpo à morte. Uma
vez que Ele morreu como nosso representante, nós morremos com Ele. Em Sua
morte, Ele pagou a pena atroz e, desse modo, cumpriu todas as exigências da Lei.
Assim, estamos livres da Lei (Rm 7:6) e de sua maldição inevitável. Estamos
livres para servir em novidade
de espírito e não na caducidade da letra (Rm 7:6). Nosso serviço é motivado por
amor, e não por medo; é um serviço prestado em liberdade, e não sob o jugo da
escravidão; não é mais um apego servil aos mínimos detalhes de rituais e
cerimônias, mas um transbordamento jubiloso de nosso próprio ser para a glória
de Deus e a bênção de outros.
II. ADÃO ILUSTRADO
NA ANALOGIA DA SOLIDARIEDADE DA RAÇA (Rm 7:7-13)
7. Que diremos,
pois? É a lei pecado? De modo nenhum! Mas eu não teria conhecido o pecado,
senão por intermédio da lei; pois não teria eu conhecido a cobiça, se a lei não
dissera: Não cobiçarás.
8. Mas o pecado,
tomando ocasião pelo mandamento, despertou em mim toda sorte de concupiscência;
porque, sem lei, está morto o pecado.
9. Outrora, sem a
lei, eu vivia; mas, sobrevindo o preceito, reviveu o pecado, e eu morri.
10. E o mandamento
que me fora para vida, verifiquei que este mesmo se me tornou para morte.
11. Porque o pecado,
prevalecendo-se do mandamento, pelo mesmo mandamento, me enganou e me matou.
12. Por conseguinte,
a lei é santa; e o mandamento, santo, e justo, e bom.
13. Acaso o bom se me tornou em morte?
De modo nenhum! Pelo contrário, o pecado, para revelar-se como pecado, por meio
de uma coisa boa, causou-me a morte, a fim de que, pelo mandamento, se
mostrasse sobremaneira maligno.
Estes versículos
referem-se à luta terrível do crente contra a natureza humana caída. Aqui,
Paulo descreve o papel importante desempenhado pela lei em sua vida antes de
ele ser salvo. Enfatiza que a lei em si não é pecaminosa, mas que revela o
pecado ao homem. Foi a lei que o convenceu da depravação terrível do seu
coração. Enquanto se comparava com outras pessoas, sentia-se razoavelmente
respeitável; porém, ao ser confrontado com as exigências da lei de Deus, viu-se
mudo e condenado.
-“Que diremos,
pois? É a lei pecado?”. Aqui, Paulo convoca os cristãos ao raciocínio: “Que diremos, pois?”. Qual a conclusão que os cristãos deveriam
abraçar? A resposta é clara: “De modo nenhum!”. A lei não é pecado! Paulo
apregoou a necessidade dos cristãos livrarem-se da lei, porém, nunca disse que a
lei é pecado.
Embora o apóstolo não
tenha afirmado no decurso da Epístola que a lei é pecado, alguns judaizantes
poderiam distorcer os argumentos e afirmar que Paulo anunciou que a lei é
pecado. Como Paulo anunciava que os cristãos eram livres do pecado e da lei,
alguém mal-intencionado poderia anunciar que Paulo estava equiparando a lei com
o pecado, distorcendo o que o apóstolo dos gentios procurou evidenciar. Mas
Paulo afirma categoricamente que a lei não é pecado (Rm 7:7). Também afirmou
que os gentios pecaram mesmo sem lei. Esta afirmação leva-nos a concluir que o
pecado surgiu da transgressão à lei (a lei moral) dada no Éden, e não da
transgressão das prescrições de Moisés. Bem antes da lei de Moisés a morte
reinou sobre todos os homens (Rm 5:13). Desde Adão até Moisés a morte reinou
sobre os homens o que significa que todos pecaram (Rm 3:23; 5:14). Daí, vale
destacar que o pecado impera à parte da lei mosaica. Como? Um homem pecou,
todos pecaram (Rm 5:18). Ora, se um só homem pecou e todos pecaram, segue-se
que o pecado que subjugou a humanidade não decorre da desobediência à lei de
Moisés, visto que, após a desobediência de Adão, Deus não instituiu, de
imediato, leis, porém, mesmo assim, todos morreram, o que demonstra que todos
estavam em pecado.
Através da ofensa de
Adão, o ser humano peca; porque foi vendido como escravo ao pecado. Jesus é
claro ao afirmar isto: “Replicou-lhes Jesus: Em verdade, em verdade
vos digo: todo o que comete pecado é escravo do pecado" (João 8:34). O homem peca porque é escravo
do pecado e não porque transgride a lei de Moisés.
Em Romanos 7:11,
Paulo enfatiza que a culpa não é da lei. O pecado que reside dentro do ser
humano o incita a fazer o que a lei proíbe. No princípio, o pecado o enganou,
levando-o a pensar que o fruto proibido não era tão nocivo, que traria
felicidade e que seria possível ficar impune. Sugeriu que Deus o estava
impedindo de desfrutar prazeres que lhe seriam benéficos. Assim, o pecado
trouxe-lhe a morte no sentido de que acabou com suas esperanças de merecer a
salvação ou obtê-la por esforços próprios.
De acordo com as
Escrituras, um homem transgrediu e todos transgrediram. Um homem pecou e todos
vêm ao mundo separados de Deus, destituído da sua glória, porque todos pecaram
pelo simples fato de serem descendentes de Adão.
O maior pecado de Adão e Eva foi a cobiça (2Co 11:3; 1Tm 2:14). Adão e Eva morreram espiritualmente,
ao desobedecerem a ordem de Deus. O mesmo aconteceu com Paulo e com todos os
demais seres humanos (Rm 1:18; 3:23). Digno de nota é o fato de Paulo mencionar
o Décimo Mandamento do Decálogo como aquele que o tornou cônscio do seu pecado
e abriu seus olhos para a própria devassidão: “pois não teria eu conhecido a cobiça, se a lei não dissera: Não
cobiçarás” (Rm 7:7). A cobiça ocorre na mente. Ainda que Paulo talvez não
tivesse cometido nenhum dos pecados mais vulgares e repulsivos, ele se deu
conta de que seus pensamentos eram corrompidos. Ele entendeu que pensamentos
perversos são tão pecaminosos quanto atos perversos. Sua vida exterior talvez
fosse relativamente irrepreensível, mas sua vida interior era poluída. Todos os
primeiros nove mandamentos são objetivos, e qualquer tribunal da Terra pode
legislar sobre eles, fiscalizá-los e condená-los. Mas o Décimo Mandamento
("Não cobiçarás") é subjetivo, pertence à jurisdição do foro íntimo,
e nenhum tribunal da Terra tem competência para julgar foro íntimo. A lei de
Deus, porém, penetra como uma câmara de raio-X e faz uma leitura dos propósitos
mais secretos do nosso coração, trazendo à luz seus desejos pervertidos.
Observe a expressão
de Paulo em Rm 7:11: “Porque o pecado,
prevalecendo-se do mandamento, pelo mesmo mandamento, me enganou e me matou”. Aqui, o verbo "enganou" é o mesmo usado em 2Coríntios 11:3 - "a serpente enganou a Eva”; e em 1Timóteo
2:14 - "a mulher, sendo enganada, caiu em transgressão". Paulo
quis dizer que o pecado seduz, engana e mata.
O Rev. Hernandes
Dias Lopes, citando William Barclay, esclarece que o engano do pecado pode ser
visto sob os seguintes aspectos:
a) enganamo-nos ao
considerar a satisfação que encontraremos no pecado. O pecado é doce ao paladar, mas amargo no estômago. É
um embusteiro, pois promete alegria e paga com a tristeza; proclama liberdade e
escraviza; faz propaganda da vida, mas seu salário é a morte.
b) enganamo-nos ao
considerar a desculpa que podemos dar pelo pecado. Todo homem pensa que pode ostentar sua defesa por ter
praticado este ou aquele pecado, mas toda escusa do pecado torna-se nula sob o
escrutínio de Deus.
c) enganamo-nos ao
considerar a probabilidade de escapar das consequências do pecado. Ninguém peca sem a esperança de que sairá ileso das
consequências do pecado. A realidade inegável, porém, é que cedo ou tarde o
nosso pecado nos achará.
Quando um criminoso
é apanhado no flagrante de seu delito, a lei exige que ele pague por seu crime.
Ele é preso e a lei o condena. Esse transgressor, porém, não pode culpar a lei
de ser responsável pelos seus problemas. Ele está preso por causa de seu crime
e não por causa da lei. A lei está livre de qualquer culpa. O vilão da história
é o pecado. Calvino ressalta que o pecado reside em nós, e não na lei, uma vez
que a perversa concupiscência de nossa carne é a sua causa. É certo que a lei
expõe, provoca e condena o pecado, mas não é responsável por nossos pecados nem
por nossa morte. Assim, a lei não pode salvar-nos porque não podemos cumpri-la,
e não podemos cumpri-la por causa do pecado que habita em nós.
A ofensa de Adão
trouxe juízo sobre todos os homens, mas o ato de Justiça de Cristo trouxe
justificação que dá vida a todos. O ato de justiça não foi a vida do Salvador
ou sua observância da lei, mas sua morte vicária no Calvário. Ela trouxe
justificação que dá vida, ou seja, a justificação que resulta em vida, e é
oferecida a todos os homens.
III. O CRISTÃO
ILUSTRADO NA ANALOGIA ENTRE CARNE E ESPÍRITO (Rm 7:14-25)
14. Porque bem
sabemos que a lei é espiritual; eu, todavia, sou carnal, vendido à escravidão
do pecado.
15. Porque nem mesmo
compreendo o meu próprio modo de agir, pois não faço o que prefiro, e sim o que
detesto.
16. Ora, se faço o
que não quero, consinto com a lei, que é boa.
17. Neste caso, quem
faz isto já não sou eu, mas o pecado que habita em mim.
18. Porque eu sei
que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem nenhum, pois o querer o bem
está em mim; não, porém, o efetuá-lo.
19. Porque não faço
o bem que prefiro, mas o mal que não quero, esse faço.
20. Mas, se eu faço
o que não quero, já não sou eu quem o faz, e sim o pecado que habita em mim.
21. Então, ao querer
fazer o bem, encontro a lei de que o mal reside em mim.
22. Porque, no
tocante ao homem interior, tenho prazer na lei de Deus;
23. mas vejo, nos
meus membros, outra lei que, guerreando contra a lei da minha mente, me faz
prisioneiro da lei do pecado que está nos meus membros.
24. Desventurado
homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte?
25. Graças a Deus
por Jesus Cristo, nosso Senhor. De maneira que eu, de mim mesmo, com a mente,
sou escravo da lei de Deus, mas, segundo a carne, da lei do pecado.
1. A santidade da lei. O apóstolo Paulo diz que “a lei é santa; e cada
mandamento, santo, justo e bom” (Rm 7:12). A Lei é santa porque ela é a voz de
Deus; ela reflete o caráter de Deus, sendo a cópia de suas perfeições; ela traz
as impressões de seu autor. Ela foi dada por Deus e, portanto, é perfeita como
expressão da vontade dele para o seu povo. A fraqueza da lei encontra-se na
“matéria prima” com a qual teve de trabalhar: ela foi dada a indivíduos que já
eram pecadores. Precisavam da lei para lhes dar conhecimento do pecado, mas,
além disso, precisavam de um Salvador para livrá-los do castigo e do poder do
pecado. Portanto, não há falha na lei; a falha está em mim que não consigo
obedecer-lhe (Rm 7:18). Sendo santa, a lei mostra o caráter maligníssimo do meu
pecado (Rm 7:13). O pecado é a maior de todas as tragédias; é pior do que a
pobreza, a fome, a doença e a própria morte, pois esses males, embora graves,
não nos podem afastar de Deus. O pecado, contudo, nos afasta de Deus agora e
por toda a eternidade.
2. A malignidade da carne (Rm 7:18,19). “Porque eu sei
que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem nenhum, pois o querer o bem
está em mim; não, porém, o efetuá-lo. Porque não faço o bem que quero, mas
o mal que não quero, esse faço”. Aqui, “carne”, obviamente, não significa
“corpo”; “carne” descreve nossa situação antes de sermos salvos, refere-se a
nossa velha natureza. Paulo sabe que nenhum bem habita em sua carne, uma vez
que não há nele poder para fazer o bem que deseja (Rm 7:19).
É válido salientar
que, quando Paulo diz, em Romanos 7:14, que é carnal, não está declarando que
não é convertido. Essa mesma expressão foi usada para referir-se aos crentes de
Corinto (1Co 3:1-3) e Paulo jamais insinuou que eles não fossem convertidos. A
verdade é que a velha natureza não é aniquilada na conversão. Ela ainda habita
em nós. Embora não tenha poder legal de nos dominar, muitas vezes ela revela
quão fracos somos.
Em nossa jornada
espiritual, há um tremendo conflito entre a carne (velha natureza) e a nossa
nova natureza. Foi o que o apóstolo Paulo disse aos Gálatas: “Porque a carne
cobiça contra o Espírito, e o Espírito, contra a carne; e estes opõem-se um ao
outro; para que não façais o que quereis” (Gl 5:17). Na verdade, existem
duas forças antagônicas que nos arrastam para direções opostas. Na justificação
fomos libertados da culpa do pecado; na santificação estamos sendo libertados
do poder do pecado, mas só na glorificação seremos salvos da presença do
pecado. Ainda lidamos contra o pecado que tenazmente nos assedia.
3. A velha natureza (Rm 7:20-25). “Mas, se eu faço
o que não quero, já não sou eu quem o faz, e sim o pecado que habita em mim”.
Podemos parafrasear esse versículo da seguinte maneira: “Se eu (a velha natureza) faço o que eu (a nova natureza) não quero, já
não sou eu (a pessoa) quem o faz, e, sim, o pecado que habita em mim”. É
bom deixar claro que Paulo não está se desculpando nem se esquivando de sua
responsabilidade como cristão salvo. Ele está apenas afirmando que a velha
natureza ainda continua habitando nele e, ao pecar, não o faz com o desejo do
novo homem.
Longe de estar
morta, no sentido de inerte, nossa natureza caída está tão viva e ativa que
somos seriamente exortados a não obedecer aos seus desejos, e o Espírito Santo
nos é concedido para que possamos subjugá-los e controlá-los. A natureza
adâmica não é extirpada na conversão, mas recebemos poder para subjugá-la e
dominá-la.
Não há nada de bom
na nossa velha natureza. Paulo vê isso como parte de sermos humanos. Embora
pertençamos a Cristo e tenhamos morrido para o pecado, ainda vivemos em um
mundo pecaminoso e temos uma natureza pecaminosa que é completamente corrupta.
Desde a queda do ser humano, há uma tensão: tentar fazer o bem e não ser capaz
de fazê-lo. Sem a ajuda do Espírito Santo, a pessoa é dominada pelo poder do
pecado e continua a fazer o mal, embora realmente deseje fazer o bem.
Deus podia eliminar
a velha natureza dos crentes no momento da sua conversão, mas não o faz. Por
quê? Porque Ele quer nos obrigar a se lembrar constantemente da nossa fraqueza;
quer nos manter sempre em estado de dependência de Cristo, nosso Sacerdote e
Advogado, e levar-nos a louvar incessantemente Aquele que nos salvou. Em vez de
remover a velha natureza, Deus nos deu seu Espírito para habitar em nós. O Espírito
de Deus e nossa carne estão constantemente em conflito, e isso continuará até o
dia em que Deus nos levar para Si. O que o crente tem de fazer é ceder ao
Espírito Santo.
CONCLUSÃO
O velho Adão é muito
forte para nós, mas graças a Deus ele não é suficientemente forte para Cristo.
Jesus Cristo, nosso Senhor, nos dará a vitória, dia-a-dia e durante todos os
dias. Por causa de Jesus Cristo um grande futuro nos está garantido. Um dia nos
uniremos a Ele na eternidade com um novo corpo, incorruptível e glorificado,
livre do poder e da presença do pecado. Amém?
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Luciano de Paula Lourenço
Disponível
no Blog: http://luloure.blogspot.com
Referências
Bibliográficas:
Bíblia
de Estudo Pentecostal.
Bíblia
de estudo – Aplicação Pessoal.
Comentário
Bíblico popular (Novo Testamento) - William Macdonald.
Comentário
do Novo Testamento – Aplicação Pessoal. CPAD.
Guia
do Leitor da Bíblia – Lawrence O. Richards
Revista
Ensinador Cristão – nº 66. CPAD.
Romanos – O Evangelho segundo Paulo. Rev. Hernandes Dias Lopes.
Hagnos.
A Mensagem de Romanos. John Stott. ABU.
Maravilhosa
Graça. José Gonçalves. CPAD.
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